Bordô, a ‘mais resistente’ das uvas

Em tempo de colheita, conheça as características de uma
das variedades que mais aumentou a área cultivada na região

Danúbia Otobelli

A produção de uvas no Brasil – que está em plena época de vindima – se divide em duas grandes espécies: um grupo formado pelas vitis viníferas, destinada para a produção de vinhos finos, e outro que engloba as uvas comuns ou americanas (vitis labrusca ou híbridas), as quais são destinadas para produção de vinho de mesa, sucos e derivados e ainda para o consumo in natura. Entre essas americanas, uma das principais variedades cultivadas na Região Nordeste do Rio Grande do Sul é a uva Bordô, caracterizada por sua tonalidade violácea intensa. Na Serra, a uva Bordô foi colhida no início de fevereiro.
Originária dos Estados Unidos, a cultivar despertou o interesse dos viticultores no século 18 devido à resistência ao oídio, doença que causava um enorme prejuízo à viticultura mundial na época. Foi introduzida no Estado por volta de 1840 com o nome de Ives – sobrenome do pesquisador americano que a selecionou -, mas se popularizou como ‘Bordô’. Sua expansão ocorreu devido a fácil adaptação as condições climáticas e a boa produtividade. “É uma uva muito resistente as principais doenças e por isso tem se mostrado muito eficiente e importante para a agricultura orgânica”, diz o engenheiro agrônomo e pesquisador em Ecofisiologia da Embrapa Uva e Vinho, Alberto Miele.
A sua resistência talvez seja o fator porque a Bordô está entre as variedades comuns que mais expandiram em área. De acordo com o estudo Área Cultivada com Videiras no Rio Grande do Sul: 2008-2012 dos pesquisadores Loiva Maria Ribeiro de Mello e Carlos Alberto Ely Machado, a viticultura está presente em 28 microrregiões do Rio Grande, sendo 80,22% da área com videiras do Estado na microrregião de Caxias. Entre as dez cultivares com maior área plantada a Bordô ocupa a segunda posição, logo após a americana Isabel. Ela foi a cultivar comum que mais aumentou sua importância relativa nos últimos anos. A Isabel ocupou em 2012 uma área de 11.264 hectares, representando 27,42% da área total, enquanto que a Bordô representa 21,03%. Porém, enquanto que a Isabel reduziu sua área de 11.499 hectares em 2011 para 11.264 hectares em 2012, a Bordô aumentou sua área em 1,64 hectares em quatro anos, passando de 6.996 hectares em 2008 para 8.637 hectares em 2012. “Da evolução da área cultivada das seis cultivares americanas e híbridas de maior expressão, nos últimos cinco anos, no Rio Grande do Sul, apenas a cultivar Bordô apresentou uma tendência crescente. As demais tenderam a manter a mesma área”, escrevem os pesquisadores.
Na região da Serra, as cultivares americanas ou híbridas de maior expressão são: Isabel com 10.630 ha, Bordô com 6.315 ha, Niágara Branca com 2.472 ha, Concord com 1.689 ha, Niágara Rosada com 1.543 ha, Seibel 1077 com 1.348 ha e Jacquez com 1.232 ha. A Isabel apresentou uma redução de 1,87% entre 2011 a 2012. Já a Bordô apresentou, em 2012, aumento de 21,84% e 3,68% em relação aos anos de 2008 e 2011, respectivamente. As cultivares Niágara Branca, Concord, Seibel 1077 e Jacquez tiveram sua área reduzida, enquanto que a Niágara Rosada teve pequeno acréscimo.

Suco com a uva Bordô

Em microrregiões como Gramado/Canela, Guaporé e Lageado a uva Bordô é predominância. Em Gramado/Canela a variedade ocupa uma área de 83,1 ha, contra 29,8 ha da Isabel. E a tendência é aumento da variedade. Por exemplo, em Guaporé a Bordô apresentou um crescimento na área cultivada em 2012 de 12% em relação ao ano de 2008. O mesmo ocorreu na microrregião de Lageado/Estrela, que teve um acréscimo de área de 26% nos últimos quatro anos. O município de Flores da Cunha, que tem uma área cultivada de videiras em 5.036 hectares, é o maior produtor de uva Bordô do Rio Grande do Sul.
Esse aumento estaria ligado, além da fácil adaptação e resistência da variedade, a grande demanda para elaboração de vinho tinto, vinagres, geléias e suco de uva. Em especial para os sucos de uva, a cor intensa cumpre um papel estratégico na cadeia produtiva. Muitas vezes, seu mosto é misturado ao de outras variedades tintas, para compor uma coloração mais vibrante. “O suco com a uva Bordô caiu no agrado de muitas pessoas e tem se revelado muito bom, pois tem cor, aroma e gosto, que associados às informações indicando os benefícios de pigmentos e taninos existentes nessa uva, faz com que ela mantenha grande potencial de expansão”, pontua o pesquisador Miele.
De acordo com o coordenador da Comissão Interestadual da Uva, Olir Schiavenin, apesar da uva Isabel ter a maior área cultivada do Estado, é a Bordô a variedade mais plantada atualmente. “Dificilmente um agricultor irá plantar Isabel, ele vai optar pela Bordô, pelos mais diversos aspectos econômicos”, diz o coordenador.
Entre essas vantagens estão a rusticidade da planta, que garante menos tratamentos e mais resistência a doenças; a melhor aceitação do mercado devido a cor e ao aroma; e a valorização do preço, que é 30% mais cara do que a Isabel. “Ela mais valorizada devido a esses aspectos, apesar da graduação glucométrica menor, e tem se dado muito bem para a elaboração do suco de uva”, explica Schiavenin.
Conforme estudo da Embrapa, das 41 variedades com maior área cultivada, as quais representam 98% da área vitícola do Estado, além da Bordô aumentaram a participação as uvas Isabel Precoce, BRS Lorena, BRS Violeta, Pinot Noir, BRS Cora, Concord Clone 30, BRS Rúbea, Malvasia de Cândia, Sauvignon Blanc, BRS Carmen e Marselan.

As variedades
As dez principais variedades cultivadas por
hectare no Rio Grande do Sul em 2012

Isabel – 11.499 ha
Bordô – 8.637 ha
Niágara Branca – 2.958 ha
Concord – 2.538 ha
Niágara Rosada – 2.048 ha
Seibel 1077 – 1.604 ha
Cabernet Sauvignon – 1.341 ha
Jacquez – 1.253 ha
Merlot – 887 ha
Chardonnay – 822 ha

Fonte: Embrapa Uva e Vinho

Bordô
Espécie: Vitis labrusca
Nome científico: Ives
Seleção: o pesquisador americano Henry Ives a selecionou em 1840. A cultivar foi levada a Portugal e após desembarcou no Brasil.
Utilizada: vinhos, sucos e geleias. Costuma entrar na composição de cortes de vinho e suco com as castas Isabel e Concord, fornecendo as bebidas a cor que lhes falta.
Características: sua planta tem fácil adaptação, boa produtividade e é resistente a doenças, por isso é utilizada na agricultura orgânica.
Área plantada no Estado: 8.637 hectares
Área plantada na microrregião Caxias: 6.315,93 hectares