Pioneirismo na Bahia

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Há mais de 30 anos, o agricultor Luis Antonio Muterle deixou Antônio Prado (RS) e se aventurou no Nordeste do Brasil

 

 

 

Entre 1989 e 1990, um dos primeiros registros da família no novo endereço. Muterle ao lado dos filhos Leandro e Fernando, ainda pequenos, na plantação de soja.

Entre 1989 e 1990, um dos primeiros registros da família no novo endereço. Muterle ao lado dos filhos Leandro e Fernando, ainda pequenos, na plantação de soja.

Nosso segundo personagem da série Cultivando Terras pelo Brasil nasceu na cidade de Antônio Prado, na Serra Gaúcha, e empreendeu bem longe, no Nordeste brasileiro. O produtor Luis Antonio Muterle, 60 anos, foi em busca do que gostava e acabou encontrando no Estado da Bahia. No novo endereço, teve períodos de adaptação difíceis e trabalhosos, mas usou a criatividade e, mais do que nunca, diversificou a produção agrícola e conquistou espaço, cresceu, aprendeu e prosperou.
Em 1985, há 31 anos, o pradense Luis Antonio Muterle deixou para trás a casa materna, na Comunidade do Passo do Zeferino, interior de Antônio Prado, e também o antigo emprego. “Fui criado na colônia, muito acostumado a ser livre. Com o passar do tempo comecei a trabalhar no comércio atacadista, mas cansei daquela rotina e resolvi buscar novos desafios. Mexer com a terra e com os animais é o que sempre gostei de fazer, por isso precisei mudar”, conta Muterle, que hoje mora na cidade baiana de Barreiras, a décima segunda mais populosa do Estado.
Com isso, o jovem de 27 anos de idade se despediu da família, inclusive da esposa e dos quatro filhos e, com a companhia de alguns amigos, começou sua viagem. De carro, Muterle passou um mês viajando pelo país e conhecendo novos lugares para investir, até chegar à região Oeste da Bahia, lá no Nordeste do Brasil. “Depois de um ano e meio, em setembro de 1987, trouxe minha família para junto de mim. Fomos todos morar na Fazenda Santa Helena”, recorda o pradense. Esta foi a primeira propriedade a ser comprada pela família, que depois adquiriu a Fazenda Vacaria e a Pantaneira, todas no município de Barreiras.
Luis se recorda que, como na maioria das vezes, o início foi muito duro. O ambiente era sofrido. “Quando chegamos lá não tínhamos onde morar. Ficamos debaixo de barracas de lona e, até conseguir cavar um poço, o que era difícil porque a vegetação local é o cerrado, pegávamos a água direto do rio”, conta o agricultor. O local um tanto cansativo se juntava aos alimentos, tão diferentes daqueles comuns aos gaúchos. “Na cidade era difícil até de achar certos alimentos que tínhamos o costume de comer. Por algum tempo trazíamos comida no Rio Grande do Sul, como farinha de trigo e arroz. O arroz, por exemplo, só existia aqui quebrado. Fomos nos adaptando e, aos poucos, essas necessidades foram sanadas”, recorda Luis.

Uma agricultura particular
Passadas as dificuldades iniciais, na Fazenda Santa Helena Luis construiu uma casa feita com madeiras trazidas da Serra Gaúcha, “que não durou muitos anos, pois os cupins aqui são famintos”, brinca. A rotina foi se adaptando, a família começou a se estruturar e as plantas foram sendo espalhadas pela terra. “Aprendemos a cultura nordestina que, na época, era muito diferente da nossa. Não tínhamos energia elétrica, nem comunicação com a família no Rio Grande do Sul. Aos poucos, com muito trabalho e dedicação, fomos superando cada dificuldade. Hoje, conquistamos tudo o que precisamos e até internet já temos na fazenda”, conta Muterle.
O trabalho na Bahia ganhou características muito diferentes das que ele era acostumado na italiana Antônio Prado. Com um pouco de coragem e empreendedorismo, Luis fez brotar da terra as mais diversas culturas agrícolas. “Trabalhei com tudo um pouco: arroz, feijão, soja, melancia, milho, além de muitas culturas que não existiam na região. Fui pioneiro na produção de abóbora e algodão, e tive também a felicidade de fazer as primeiras plantações irrigadas”, orgulha-se. Além da agricultura, aventurou-se também na pecuária. “Sou pioneiro no confinamento de gado de corte na região. Produzimos todo o alimento necessário para os animais dentro da própria fazenda”, complementa Muterle. Hoje, somando as três fazendas da família, são cerca de 2,6 mil hectares de terras, ocupadas pelas produções de soja, feijão, abóbora, milho e gado para criação e engorda. A Fazenda Santa Helena ainda é a moradia da família, que, apesar de possuir funcionários, ainda encarrega-se pela maior parte do trabalho.
A trajetória de Luis orgulha a esposa, Ida Maria Girardello Muterle, e os quatro filhos do casal, Suzana Muterle Viccini, Neuza Muterle Brezolin, Fernando Muterle e Leonardo Muterle. “Sentimos muito, muito orgulho. Nosso pai batalhou muito na vida, nunca deixou a família passar por necessidades. Tudo o que construiu foi fruto do seu trabalho, que nunca teve dia ou hora pra ser realizado. Não teve oportunidade de estudar, mesmo sendo filho de professora, precisou trabalhar muito cedo, dia e noite. Sempre foi muito corajoso, sempre ajudou e encorajou a quem precisasse. Nosso exemplo de coragem”, valoriza a filha Neuza.

Luis rodeado pela esposa, os filhos e netos.

Luis rodeado pela esposa, os filhos e netos.

Os Muterle de Antônio Prado formaram família na Bahia e hoje cresceram. Além dos genros e noras, Luis e Ida têm seis netos. “Os netos são todos nascidos na Bahia, nossos baiuchos – filhos de gaúchos nascidos na Bahia”, brinca Neuza. A cada dois ou três anos eles retornam para o Rio Grande do Sul para visitar irmãos. A nostalgia da Terra Natal é comum. “O local onde nasci, a casa dos meus pais, Irene Boff Muterle e Lauro Santo Muterle, hoje falecidos, me desperta muitas saudades. A casa paterna é preservada até hoje pela família”, conta Luis.