Tratamento nas videiras com pulverização eletrostática

Tecnologia eletrifica as gotas que são atraídas pela planta gerando uma aplicação uniforme, com menos água e produto

Para a pulverização eletrostática, os bicos hidráulicos do pulverizador convencional são substituídos por bicos pneumáticos que conduzem carga em cada gota de tratamento

Para a pulverização eletrostática, os bicos hidráulicos do pulverizador convencional são substituídos por bicos pneumáticos que conduzem carga em cada gota de tratamento

Depois da poda nos vinhedos, tem início a brotação e, com isso, abre-se também o período de cuidados para prevenir doenças e reduzir as fontes de sobrevivência dos fungos que atacam as plantas. Quando se fala em pulverização muitas são as novidades em maquinários e produtos, e neste ano a pulverização eletrostática ganha atenção. É um sistema elétrico instalado no pulverizador convencional, onde os bicos hidráulicos são substituídos por bicos pneumáticos que conduzem carga em cada gota de tratamento. O resultado está na disposição uniforme e controlada dos agrotóxicos, evitando a contaminação ambiental e dos aplicadores, além do acúmulo de resíduos nos produtos finais, especialmente no caso da uva ou outras frutas vendidas in natura. Entre os benefícios está ainda a economia de água e produto. Mas, atenção, o manejo do vinhedo deve ser controlado, caso contrário sua pulverização será um desastre.

No momento da pulverização convencional, as gotículas, devido as suas pequenas massas, possuem pouca energia cinética (relacionada ao movimento), o que faz com que suas capturas pelos alvos sejam reduzidas e também que a evaporação e deriva se acentuem. Pesquisas indicam que a evaporação de gotas é um dos principais fatores de desperdício de agrotóxico nas aplicações. Durante um processo de pulverização, o campo de gotas produzidas por um bico hidráulico é extremamente desuniforme, onde existe uma grande porcentagem de gotas que são perdidas por evaporação. A pulverização eletrostática se apresenta como uma solução tecnológica para aumentar a eficiência de utilização de pequenas gotículas, reduzindo as perdas para o solo ou mesmo por evaporação.

O sistema foi criado na década de 1960 nos Estados Unidos e, embora já seja utilizado por agricultores de muitos países, é uma inovação para o setor no Brasil. Um dos motivos é que os pulverizadores eletrostáticos importados ou mesmo construídos no país têm alto custo de investimento, inviabilizando a tecnologia para pequenos e médios produtores. Há aproximadamente três anos foram criadas empresas no mercado brasileiro que fazem a transformação do pulverizador convencional em pulverizador eletrostático a custos mais acessíveis.

De acordo com o engenheiro agrônomo da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater RS/ASCAR), Enio Todeschini, na pulverização tradicional há uma perda média de 60% das gotas que saem dos bicos, seja por deriva ou evaporação, o que na pulverização eletrostática diminui para 5%. “Outro grande diferencial é que no sistema convencional se usa mais água, uma média de 400 a 500 litros, onde na eletrostática fica por 100 a 200 litros. Contudo isso gerou dúvidas na dosificação, porque se antes, perdendo 60% das gotas o sistema funcionava, porque usar a mesma dosagem? Isso está sendo pesquisado para tornar o sistema ainda mais eficiente”, explica Todeschini. A pulverização eletrostática foi um dos assuntos abordados durante o Dia de Campo da Emater, promovido em setembro na cidade de Flores da Cunha.

Gotas eletrizadas precisam de manejo adequado
Para ter uma pulverização eletrostática, o produtor precisa adquirir o sistema – entre compra e instalação o investimento varia de R$ 12 mil a R$ 15 mil –, que é instalado no pulverizador convencional. Os bicos hidráulicos são substituídos por bicos pneumáticos, acompanhados por caixa de comando, central e carregador. Esses bicos pneumáticos conduzem em cada gotícula, que é menor que no sistema convencional, uma carga eletrostática que, pelo fenômeno de indução, é atraída pela videira que tem carga oposta por estar aterrada – cargas de polaridades opostas se atraem e semelhantes se repelem, por isso as gotículas não se chocam uma nas outras. Com isso, cada espaço da planta conduzirá uma gotícula, tendo um tratamento distribuído uniformemente pelas folhas, ramos e troncos. Com isso, a pulverização eletrostática se torna uma alternativa promissora para redução de perdas na aplicação de agrotóxicos e economia de água.

Antes de converter o pulverizador para o sistema eletrostático, contudo, o agricultor precisa buscar informações para não tornar o investimento um gasto inútil. O fitopatologista da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa Uva e Vinho), Lucas Garrido, explica que o manejo do vinhedo deve ser diferenciado, buscando um crescimento vegetativo (folhagem) aberto que permita a entrada das gotas no interior da copa. “Se a planta não for bem conduzida, a pulverização eletrostática será um desastre. Como as gotículas se repelem umas das outras, em caso de uma copa fechada, elas vão chegar à parte de baixo da planta, se distribuindo uniformemente, contudo não vão conseguir alcançar as folhas do meio nem de cima, serão repelidas e as doenças terão acesso, por isso o manejo adequado é chave para quem quer aderir ao sistema eletrostático”, explica o pesquisador na área de controle de doenças da videira.

O pesquisador da Embrapa Lucas Garrido explicou a recente opção de pulverização no Dia de Campo da Emater, promovido em setembro, em Flores da Cunha

O pesquisador da Embrapa Lucas Garrido explicou a recente opção de pulverização no Dia de Campo da Emater, promovido em setembro, em Flores da Cunha

Tendo um manejo adequado, evitando um vigor vegetativo excessivo, a pulverização eletrostática pode ser utilizada tanto em vinhedos na condução espaldeira quanto latada. “Quem não tem manejo não recomendo esse sistema. É comum alguns produtores buscarem um excesso de adubação, principalmente nitrogenada, e com isso o vigor da planta aumenta muito e a copa fica fechada. O sistema espaldeira bem conduzido é perfeito para a tecnologia e na latada também pode ser, mas o manejo deve ter a poda verde, desponta, evitando o excesso vegetativo, que definitivamente impede o uso desse sistema. Deve-se priorizar a qualidade ao invés da quantidade”, complementa Garrido. O sistema já está disponível em casas agrícolas e, após a conversão dos bicos, esporadicamente é necessária manutenção, caso contrário eles deixam de conduzir carga às gotículas. “É muito importante buscar informações técnicas para saber se na sua propriedade o investimento será de fato proveitoso”, sugere Garrido.

Nas desvantagens da tecnologia, o pesquisador indica, além do custo para a transformação do pulverizador convencional em eletrostático, a baixa eficiência no controle de doenças em parreirais muito fechado ou com muito desenvolvimento vegetativo e a necessidade de manejo da parte aérea (poda verde, desponte entre outras operações) ainda pode acontecer a ocorrência de fitotoxicidade, resultante de concentrações elevadas de alguns agrotóxicos resultantes da utilização da recomendação de dose por hectare em um volume de calda de 80 a 100 litros e a menor eficiência para o controle de podridões da uva nos estádios após a compactação do cacho, devido a dificuldade do produto penetrar no interior do mesmo.

As vantagens
Além da economia de água e de produtos citada pelo engenheiro agrônomo Enio Todeschini, o emprego de gotas com carga eletrostática para aplicação de agrotóxicos, não somente em videiras, mas também em culturas de porte rasteiro, arbustivo e arbóreo, confirma que é possível reduzir, com facilidade, mais de 50% dos ingredientes ativos recomendados nas aplicações, sem reduzir a eficácia biológica. Além de aumentar a eficiência no controle, a pulverização eletrostática reduz os efeitos dos inseticidas sobre os organismos que vivem no solo, porque as perdas para o solo chegam a ser 20 vezes menores que numa pulverização convencional. “O principal objetivo da pulverização eletrostática é a melhor aplicação dos produtos para que os mesmos cheguem ao alvo para uma eficiência maior no controle. Poder reduzir a dose dos produtos aplicados é outra pergunta geralmente feita por técnicos e produtores, mas este não é o objetivo principal desse tipo de pulverização. Contudo em algumas situações isso pode também ser conseguido”, adianta o pesquisador da Embrapa Lucas Garrido.

Há dois anos a Embrapa Uva e Vinho iniciou testes em vinhedos no sistema espaldeira e latada buscando qual a melhor forma de dosar os produtos, especialmente no controle do míldio (levando em conta a dosagem para 100 litros ou por hectare). “De um modo geral, todas as doses se mostraram eficientes. Embora não podemos generalizar a recomendação para todos os produtos que estão no mercado, pois não foram testados um a um. Pelos dados obtidos até o momento, e também por comentários de pesquisadores do exterior, é possível pelo menos uma redução de 50% nos produtos utilizados”, destaca Garrido. Resumindo, a pulverização eletrostática proporciona a melhor cobertura do alvo com o produto; a redução da deriva dos produtos aplicados; a redução do volume de calda e consequentemente menor tempo para aplicação, pois há menos reabastecimento; menor contaminação ambiental e exposição do aplicador; e maior eficiência no controle. Isso tudo aliado sempre ao olho atento no manejo.