O patriarca do cooperativismo vitivinícola
O italiano Stefano Paternò é considerado o pai do cooperativismo gaúcho. Foi ele que em 1911 organizou as vinícolas no sonho cooperativista. Mas, Paternò deixou herdeiros que deram continuidade ao seu ideal décadas após a crise do setor. Um deles foi o imigrante italiano Arthur Perottoni, que durante um período de dificuldades econômicas viu no movimento cooperativista uma forma de superação. Junto com outros 11 homens ele fundou a Cooperativa Vitivinícola Forqueta, cantina que presidiu durante mais de 30 anos e que se tornou um marco histórico da uva e do vinho.
Natural de Trento (mas austríaco no passaporte) chegou ao Brasil com apenas alguns meses de idade em 6 de dezembro de 1875, nos braços dos pais Eustachio e Rosa Perottoni. A família se estabeleceu no lote n° 2, no Travessão Milanês, na 1ª légua da antiga Colônia Caxias. Ali dedicaram-se, como a maioria dos colonos, à produção de uvas. E mesmo tendo frequentado pouco os bancos escolares possuía uma ampla visão empreendedora. Já adulto, comprou terras na colônia Sertorina, no atual centro de Forqueta. Na localidade, casou-se com Maria com quem teve 12 filhos. Em 1910, com a chegada da estrada de ferro, resolveu mudar-se para longe da população, pois, dizia ele, suas plantações eram constantemente roubadas. Conforme contou o filho Faustino (que também foi presidente da Cooperativa), Arthur teve as terras invadidas pelos cortadores de mato e viu suas plantações serem roubadas e cortadas pelos novos moradores, que ocupavam a área da Estação Férrea. Desgostoso com esses problemas, vendeu suas terras e foi viver numa área mais distante, na Linha Feijó, nos dias atuais pertencente ao município de Farroupilha e onde até hoje vivem seus netos. Nas novas terras, construiu uma casa de basalto com uma grande cantina no porão. Como os outros produtores, elaborava seu vinho e vendia o produto. Participou do movimento cooperativista proposto por Paternò, presidindo a Cooperativa Nova Vicenza, nas primeiras décadas de 1910. Ficou amargamente desiludido quando a ideia desmoronou em 1917. Voltou a trabalhar na agricultura e a produzir seu vinho. E mesmo com o fracasso do cooperativismo, lia e estudava muito sobre o movimento. Costumava acompanhar as melhorias técnicas do cultivo da uva e da produção do vinho, as quais aplicava em sua propriedade.
A cooperativa
Em 1929, Arthur tinha 54 anos e via a história se repetir. Os colonos possuíam uma grande safra, porém enfrentavam dificuldades para vender seus vinhos – como havia ocorrido nas primeiras décadas do século XX. Os agricultores conseguiam vender apenas parte da safra, enquanto que o restante era comercializado para compradores urbanos, que pagavam preços bem inferiores ao custo da produção. Diante do problema, a solução cooperativista idealizada por Paternò retornava e Perottoni, como conhecedor da causa, era um dos principais articuladores.
Em seu diário, ele escreveu como transcorreu o processo para o nascimento da Cooperativa Forqueta. O comerciante Joaquim Slomp, comprava vinho dos colonos desde 1910 para revender em sua casa comercial, porém naquele ano, não conseguiu colocar toda a produção de vinho no mercado regional. A situação encontrava-se crítica não somente para ele, como também para os colonos, afinal no vilarejo todos se conheciam ou tinham laços de parentesco.
Foi então que em 19 de abril de 1929, após uma noite de insônia, Joaquim procurou Arthur para conversar, pois ele havia atuado na primeira fase do cooperativismo gaúcho e mantinha boas relações com as autoridades estaduais e municipais.
Foi a boa vontade, o zelo e a experiência de Arthur que fizeram o restante. Pois, ao ouvir a sugestão de Joaquim, ele julgou que a criação de uma cooperativa vitivinícola seria a solução para a crise do vinho colonial. Arthur prometeu ao amigo pensar sobre a proposta e dar uma posição no dia seguinte. Naquela noite, escreveu em seu diário: “com a cooperativa, daremos um salto no escuro”. Mesmo sabendo dos riscos, ele aceitou o desafio e deu início a segunda remessa da árvore cooperativista.
Tão logo decidiram pela cooperativa, foi formada uma comissão para divulgar a ideia e organizar a entidade. Os dois amigos convocaram os colonos para a assembleia que criaria a Forqueta.
Em 11 de agosto de 1929, no porão da casa comercial de Joaquim reuniram-se alguns produtores de uva de Forqueta e de outras localidades, além de autoridades ligadas ao setor, para fundar a Cooperativa Forqueta, a primeira da América Latina na produção de vinho.
Descrito como um homem bondoso e solícito, Arthur deu engrenagem a cooperativa enfrentando as dificuldades e a falta de meios iniciais, já que não possuíam um prédio próprio e nem equipamentos. Em seu início a cooperativa funcionou no porão da casa comercial de Joaquim. Sem nenhuma legislação específica, eles seguiram em frente para tocar o novo negócio. Como era de praxe, Arthur foi eleito o presidente.
Com o passar do tempo, a Cooperativa Forqueta aumentou a produção e o número de associados. Com isso foi possível construir a sede própria, situada em frente aos trilhos do trem, local apropriado para o transporte do vinho para outras regiões. Em 1932, a cooperativa obteve sua primeira premiação durante a Festa da Uva de Caxias do Sul.
Durante muitos anos, a Forqueta foi a grande família de Arthur. Na cooperativa, ganhou o título de patriarca do cooperativismo vitivinícola e foi eleito pelos associados por mais de trinta anos como presidente e, junto com Primo Slomp, construiu uma sociedade que marcou época. Permaneceu como diretor presidente até sua morte em 10 de maio de 1962 e, apesar da idade avançada, continuava indo, todos os dias, da sua casa até a cantina a pé. Morreu cercado de respeito e veneração dos cooperativados e dos cooperativistas, sendo homenageado com nome de rua em Forqueta.
Fontes: Loraine Slomp Giron/ Jornal O Pioneiro/ Livro 80 Anos de Lutas –
A Cooperativa Forqueta e o Cooperativismo Vitivinícola Gaúcho, de Loraine Slomp Giron.
Danúbia Otobelli
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