Colheita mecanizada: tudo o que o viticultor precisa saber para garantir eficiência, segurança e qualidade

Com base nas orientações técnicas da Embrapa Uva e Vinho, esta matéria é um guia completo e indispensável para viticultores que consideram adotar a mecanização da colheita em suas propriedades

Com os avanços tecnológicos e a crescente escassez de mão de obra no campo, a colheita mecanizada tem ganhado cada vez mais espaço na vitivinicultura brasileira. No entanto, sua adoção não pode ser feita de forma precipitada. Trata-se de uma decisão estratégica que exige planejamento técnico detalhado, adequações estruturais e conhecimento profundo das condições do vinhedo. Nesta reportagem, reunimos as principais orientações da Embrapa Uva e Vinho, com base nas contribuições dos pesquisadores César Girardi, Luciano Gebler e do técnico Roque Zílio, para oferecer ao viticultor um panorama claro e confiável sobre os desafios, requisitos e benefícios da colheita mecanizada.

Para mudar no sistema de colheita, o viticultor deve realizar uma análise criteriosa de sua propriedade, conforme apontam César Girardi e Roque Zílio. “Antes de optar pela colheita mecanizada, o viticultor deve avaliar cuidadosamente o sistema de condução adotado, a estrutura física do vinhedo, a acessibilidade para máquinas agrícolas e o perfil das cultivares em produção”, orientam.

De acordo com os especialistas, “a decisão de mecanizar a colheita deve estar fundamentada em um planejamento técnico que considere tanto os aspectos estruturais e econômicos quanto os cuidados agronômicos necessários para manter a sanidade e o vigor das plantas”.

Ainda segundo os dados do Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa, “em vinhedos conduzidos em latada já implantados, a colheita mecanizada mostrou-se economicamente viável apenas em áreas com mais de 14,1 hectares, resultando em uma redução de 6,6% no custo total da colheita em comparação com a colheita manual”.

Um dos principais gargalos da mecanização está relacionado à condução das plantas. Os sistemas tradicionais de latada, ainda amplamente utilizados no Sul do Brasil, não foram projetados para facilitar o acesso das colhedoras aos cachos. Assim, a Embrapa tem desenvolvido e avaliado sistemas alternativos, como o H simples e o H duplo. Ambos orientam a formação dos braços produtivos de modo a concentrar os cachos na entrelinha, facilitando o trabalho da máquina e potencializando a produção.

“A estrutura ideal do vinhedo deve garantir que os cachos estejam posicionados dentro da faixa de atuação da colhedora, sem exigir repasses manuais que reduzem a eficiência e elevam os custos”, destacam Girardi e Zílio.

A mecanização da colheita começa bem antes da chegada das máquinas. O terreno precisa estar nivelado e sem obstáculos que possam comprometer a operação. Desníveis, buracos, sulcos ou áreas com acesso restrito podem causar atolamentos, falhas de colheita e até danos permanentes à estrutura do vinhedo. Em regiões com topografia acidentada, soluções como patamares, curvas de nível ou rampas suaves podem ser adotadas para viabilizar o trânsito seguro da colhedora.

Além disso, as vias internas devem ser largas, compactadas e com bom raio de giro, permitindo a circulação eficiente de colhedoras, tratores e caminhões. A logística de transporte das uvas também deve ser integrada ao sistema mecanizado, garantindo que o produto seja processado o mais rápido possível após a colheita.

A vibração utilizada pelas colhedoras pode causar microlesões nos ramos, folhas e sarmentos. Essas lesões, ainda que discretas, abrem portas para a entrada de patógenos fúngicos, como Botryosphaeria sp., capazes de comprometer a sanidade e a longevidade das plantas. Por isso, os especialistas recomendam: “A colheita mecanizada, por utilizar vibração para desprender as bagas, pode causar lesões leves em folhas, ramos e sarmentos… Por isso, a Embrapa recomenda a aplicação imediata de fungicidas após a colheita, como medida preventiva para preservar a sanidade e a longevidade do vinhedo”.

Quanto à qualidade do produto final, estudos da Embrapa demonstram que a colheita mecanizada, quando bem executada, não compromete os parâmetros físico-químicos dos sucos – como teor de sólidos solúveis, acidez volátil e teor alcoólico – desde que o processamento ocorra até 24 horas após a colheita. “A qualidade do suco no estudo que vem sendo realizado não foi comprometida”, garantem.

Nem todas as cultivares se comportam da mesma forma diante da colheita mecanizada. Uvas com cachos bem expostos, bagas firmes e arquitetura equilibrada tendem a responder melhor à vibração da colhedora. A Embrapa está avaliando a performance de cultivares como Bordô, Violeta, Magna, Isabel Precoce, Cora, Lorena e Carmem, todas com resultados positivos no que diz respeito à eficiência da colheita e à integridade das bagas. “Os resultados iniciais têm sido promissores para todas as cultivares estudadas, com desempenho satisfatório em termos de eficiência de colheita e integridade das bagas”, relatam.

A mecanização em regiões montanhosas, como a Serra Gaúcha, apresenta limitações operacionais importantes. A inclinação do terreno pode dificultar o acesso e comprometer a estabilidade da colhedora. Ainda assim, equipamentos adaptados ao mercado brasileiro já permitem operar em áreas com declividade moderada. Modificações no rodado das máquinas, como a substituição por sistemas de lagartas, têm sido adotadas em regiões europeias montanhosas e podem ser uma alternativa futura para o Brasil. “Antes de tudo, deve-se avaliar quais partes do vinhedo podem ser atendidas pela máquina. O produtor deve entender que é o parreiral ou vinhedo que deve estar adaptado à máquina e não vice e versa”, reforça Luciano Gebler.

Para produtores que ainda não estão prontos para mecanizar, a recomendação é iniciar um processo de transição. Ao renovar o vinhedo, deve-se adotar espaçamentos compatíveis, sistemas de condução adequados e infraestrutura ajustada para o tráfego de máquinas. “Ele deve inicialmente começar a se inteirar a respeito dos equipamentos disponíveis no mercado, e, gradualmente, ajustar seu sistema produtivo ao maquinário. É um processo que ele deve observar com calma”, orienta Gebler.

A mecanização não é uma solução universal, mas uma ferramenta poderosa quando aplicada com critério. Nas palavras do pesquisador: “Não é a máquina que deve se adaptar ao vinhedo – é o vinhedo que precisa estar apto à mecanização. Com planejamento técnico e visão de longo prazo, é possível colher os benefícios de um sistema mais eficiente, sustentável e alinhado às demandas da vitivinicultura contemporânea”.

Leia também: Boletim técnico da Embrapa sobre colheita mecanizada em latada

Em caso de dúvidas ou para iniciar o planejamento, a recomendação é procurar apoio técnico de profissionais especializados em vitivinicultura de precisão.

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