Henrique Pessoa dos Santos e Maria Emília Borges Alves
Pesquisadores da Embrapa Uva e Vinho
As condições meteorológicas observadas desde o início do ciclo produtivo 2017/2018, compreendendo períodos de outono e de inverno, têm causado preocupação em produtores, pesquisadores e técnicos, dadas as anomalias verificadas quando comparadas às condições normais, que podem afetar a fenologia da maioria das fruteiras de clima temperado no estado do RS.
Aqui apresentamos dados meteorológicos dos municípios de Bento Gonçalves, na Serra Gaúcha, e de Vacaria, na região dos Campos de Cima da Serra (Figuras). Das variáveis observadas, a temperatura do ar mínima média tem se mantido acima das normais em praticamente todo o período observado e, por consequência, a temperatura do ar média também tem se mantido elevada e o acumulo de horas de frio abaixo de 7,2 °C (HF < 7,2 °C), para ambos os municípios, está sensivelmente abaixo do esperado para esta época do ano.
Outra observação importante, diz respeito às chuvas: desde meados de junho até o final de julho, o volume precipitado se manteve bem abaixo do esperado, e no mês de julho praticamente não choveu.
Estas condições com períodos longos de temperatura elevada durante o inverno, em conjunto com a redução no somatório de frio, alteram as respostas fisiológicas da videira e de outras espécies frutíferas que são cultivadas aqui no sul do Brasil. No aspecto geral, as plantas menos exigentes em acúmulo de frio para a brotação, antecipam a superação do estado de dormência e já iniciam a brotação de gemas, principalmente as gemas mais apicais. Isto é facilmente observado com a florada de pessegueiros (ex.: Chimarrita) e de macieira (ex.: Eva e Ana), bem como a brotação de videiras (ex.: Chardonnay) (Tabela 1).
Para as cultivares de Vitis labrusca (ex.: Isabel, Bordô, Concord, Niágara), que são de baixa exigência de frio (90 HF), mas com alta exigência de calor para atingir a brotação, até o momento a condição térmica deste inverno não promoveu antecipações significativas de brotação.
Outro fator que também contribui para a não antecipação da brotação nas videiras foi a condição de estiagem durante a segunda quinzena de julho. Contudo, com a continuidade destes dias quentes e a ocorrência de chuvas, poderá haver também a brotação destas cultivares. O grande problema destas brotações antecipadas, durante o inverno, é o risco de perda destas brotações e florações precoces por geadas tardias, sejam no inverno ou na primavera. Nos casos mais extremos, essas geadas podem comprometer a produção em 100%, como ocorreu em algumas áreas na primavera de 2015. Infelizmente, até o momento não se dispõe de nenhum produto comercial para impedir a brotação de uma planta. Além disso, também não se dispõe de nenhum produto químico para evitar os danos por congelamento que uma geada tardia pode promover.
Dentre as recomendações que podem ser trabalhadas para superar esse risco de geada, destaca-se a seleção de cultivares com brotação mais tardia para os locais que apresentam maior risco de geadas tardias, tais como locais baixos e protegidos do vento. Além disso, podem ser adotadas pulverizações – com água – por aspersão sobre as plantas na madrugada com risco de geada, o que irá contribuir para formação de gelo externo na planta, evitando a formação de gelo interno nos tecidos.
Para as cultivares mais tardias e exigentes em soma de frio, tais como as videiras Cabernet Sauvignon, macieiras Gala e Fuji e a maioria das cultivares de Kiwi, o inverno não está sendo muito favorável para superação do estado de dormência. Neste caso, o impacto destas condições sobre a produção será pela deficiência de brotações ou floradas por planta, pois muitas gemas permanecerão no estado latente. Para superar esse problema, recomenda-se que os produtores já preconizem uma poda mais curta, preferencialmente em esporão, para evitar problemas de brotação. Nos casos em que isto não for possível, como nas cultivares com baixa fertilidade de gemas basais, recomenda-se o uso de tratamentos para a indução de brotação para garantir a produção deste próximo ciclo.
Tabela 1: Dados de exigência média de horas de frio (horas com temperatura ≤ 7,2 °C) durante o período de dormência para atingir o máximo percentual de brotação na primavera. Informações compiladas de publicações técnicas disponíveis na literatura sobre cada cultura.