O processo de senescência das folhas no outono se deve a ação de hormônios vegetais, tais como ácido abscísico e etileno. Estes hormônios são acumulados pela planta em condições de estresses físico/químicos, como falta ou excesso de água (alagamento), toxidez por algum composto presente no solo (por exemplo: excesso de cobre, resíduo de herbicida, etc.), mas também por estresses bióticos, como excesso de produção por planta, presença de vírus ou de fungos causadores de doenças de raiz, de tronco ou foliares, como o míldio. Portanto, se as plantas no vinhedo estiverem sujeitas a condições de estresse ao longo do ciclo, certamente a vida útil das folhas diminuirá drasticamente na fase de pós-colheita e serão prejudicadas em acúmulo de reservas, vigor e em potencial produtivo nos ciclos seguintes. Diante destas colocações, é imprescindível o cuidado sanitário das plantas durante todo período vegetativo e final de ciclo, principalmente em anos com alta pluviosidade, como ocorreu nos últimos meses desta safra 2016/2017.
A mudança da cor nas folhas (de verde para amarelada) pode ser explicada principalmente em virtude da degradação dos cloroplastos das folhas. Essa tonalidade amarelada é típica para variedades que produzem uvas brancas, enquanto nas variedades de uvas tintas, pelo fato de possuírem uma elevada concentração de antocianinas nos tecidos, as folhas senescentes apresentam colorações que variam do vermelho ao roxo ou violáceo, dependendo do pH do meio. É importante destacar que o processo de senescência geralmente se distribui de modo uniforme entre as plantas do vinhedo, porém, quando ocorre variação ou antecipação na senescência ou queda foliar em manchas ou reboleiras, é importante que o viticultor verifique as causas.
Certamente estes sintomas estão associados a algum fator de estresse, como a incidência de doenças fúngicas (figuras 1 e 2), pragas, viroses, deficiências nutricionais, problemas na região de enxertia da planta e variações físicas (ex.: profundidade) ou químicas do solo. Se parte significante do parreiral está amarelado ou avermelhado, e se observam plantas com folhas de coloração mais escura que aquela característica da senescência, destoando do restante do vinhedo, estas plantas podem estar afetadas por viroses ou situadas em solo com excesso de nitrogênio, resultante da presença excessiva de matéria orgânica ou adubação mineral desequilibrada.
Em qualquer caso, é importante marcar as plantas com coloração diferenciada a fim de monitorá-las no ciclo seguinte. Este monitoramento consiste em observar seu vigor e produtividade na safra, assim como realizar exames do tecido vegetal em laboratório para detectar possíveis doenças ou deficiências nutricionais. Outro sintoma que o produtor deve estar atento é a queda precoce de folhas. Nesse caso, a causa mais provável é a incidência de doenças da parte aérea, como a mancha-das-folhas, causada pelo fungo Pseudocercospora vitis (anamorfo de Mycosphaerella personata) (figura 1) e o míldio, causado pelo fungo Plasmopara viticola (figura 2). Em termos da fase de senescência dos órgãos de parte aérea da videira, a mancha-das-folhas, causada pelo fungo Pseudocercospora vitis (anamorfo de Mycosphaerella personata) seria a principal doença a ser controlada no vinhedo. A razão deste controle reside no fato de que, se a copa não estiver protegida, o processo de senescência pode ser bastante acelerado, e, por essa aceleração, a planta pode deixar de manter folhas ativas em termos de fotossíntese e mobilização de reservas de carboidrato para as raízes. Assim, manter o vinhedo sem proteção para mancha-das-folhas, no período de pós-colheita, em sucessivas safras, pode acarretar no enfraquecimento das plantas e aumento de susceptibilidade das mesmas para outras doenças. Em termos gerais, o controle da mancha-das-folhas pode ser feito pela aplicação de fungicidas usados para o controle do míldio, exceto os cúpricos.
Além da coloração foliar, nesta etapa de transição entre colheita e dormência, o viticultor deve estar atento aos sintomas de murchamento nas folhas (também nos cachos antes da colheita) e brotações. Estes são, geralmente, sintomas de infecção por fungos de raízes, como Fusarium oxysporum, Phaeoacremonium sp. e Cylindrocarpon destructans, sendo este último o fungo causador da doença ‘pé-preto’ da videira. Estes fungos atacam os vasos do xilema da planta, por onde são transportados os nutrientes e a água do solo para a parte aérea e interrompem esse fluxo, que leva ao definhamento da parte aérea, antecipação da senescência e até à morte precoce das plantas. Estar atento a estes sintomas (cujas doenças são confirmadas por exames laboratoriais) contribui para evitar a disseminação do patógeno para as plantas sadias adjacentes e para o solo, ao retirar as plantas doentes do vinhedo. É importante salientar que, no caso destas doenças, não se recomenda o plantio imediato de nova muda no local, que pode estar contaminado com o patógeno e deve ser tratado antes de um novo plantio.
Para evitar o acúmulo de trabalho no momento da poda de inverno, os viticultores costumam efetuar a pré-poda no outono, atividade que consiste em retirar os ramos que produziram no ano, eventualmente despontar algum galho e proceder a seleção e amarrio dos sarmentos que vão produzir na próxima safra (figura 3). Essas operações são realizadas visando a possibilidade de facilitar, ao final do inverno, a poda seca, que pode ser curta, longa ou mista (ou seja, por esporão, vara ou ambas)
(figura 4), dependendo da variedade e do vigor das plantas. Contudo, cabe destacar que o viticultor não pode antecipar a pré-poda e a desponta dos ramos no outono antes que ocorra a queda natural das folhas. Caso não espere o processo de senescência se concretizar, ele estará propiciando uma supressão de nutrientes da planta, podendo gerar desequilíbrios fisiológicos que impactam no vigor de crescimento, na perda de produtividade e na vida útil do parreiral.
Nesse sentido, o ideal é o produtor esperar a queda natural das folhas da videira para iniciar as práticas de pré-poda, momento que varia de acordo com a variedade ou com o histórico da safra. Geralmente, nas condições sul-brasileiras, já é possível iniciar essas práticas a partir da segunda quinzena de maio para a maior parte das variedades de videira. Nesta etapa, após a queda natural das folhas, o produtor também pode efetuar a poda antecipada ao invés da pré-poda. A poda antecipada corresponde à execução da poda definitiva das plantas no outono, já deixando a carga de gemas do ciclo seguinte. Esta prática tem sido testada em vinhedos das regiões da Serra Gaúcha e Campanha e tem se apresentado como uma alternativa para distribuir melhor a mão de obra na execução da poda.
As plantas com poda antecipada apresentam um comportamento de brotação muito similar às plantas podadas na época convencional (final de julho/agosto), inclusive com certo atraso na data de brotação. Contudo, cabe destacar que essa prática ainda não está validada para todas as variedades e locais de cultivo. Recomenda-se que o viticultor efetue testes em algumas plantas no vinhedo, observando os impactos na produção, antes de executá-la em toda área. Outro fator importante são os ferimentos de poda nesta época de outono, que permanecem mais tempo abertos: o produtor deve ter maior cuidado sanitário com esses cortes da poda, sendo para isto, necessária a aplicação de produtos específicos, como Score na dosagem de 1 g/L, para evitar a entrada de fungos de madeira. Não menos importante, é a prática de desinfecção das tesouras de poda entre plantas, principalmente entre aquelas marcadas que apresentaram variações de cor e murchamento de folhas no período de senescência, conforme destacado anteriormente.
Alguns produtos de ação desinfetante para as tesouras de poda, com suas respectivas concentrações de uso: produto comercial à base de dióxido de cloro estabilizado a 5%, diluído em água na proporção de 1 ml do produto para 1litro de água; Álcool 70%; Hipoclorito de sódio (água sanitária), diluído em água na proporção de 1:1 (v:v).
O acompanhamento da senescência, além de interessante no aspecto paisagístico, é uma etapa importantíssima para a garantia da sanidade e longevidade do vinhedo.
Embrapa Uva e Vinho
Pesquisadores
Samar Velho da Silveira,
Henrique Pessoa dos Santos
e Fábio Rossi Cavalcanti.