A década de 1920 não estava fácil para o setor vitivinícola gaúcho. Brigas, crise econômica, Concorrência desleal e desentendimento entre as lideranças faziam parte do cenário de muitas vinícolas.
Preocupadas, as autoridades reuniram 41 vinícolas em torno de uma instituição comum, o Sindicato
Viti-vinícola do Rio Grande do Sul. Era a tentativa de unir a vitivinicultura gaúcha. Em 1929, no auge da
crise mundial, o Sindicato serviu de braço para a fundação do que viria a ser um dos grandes mitos da
vitivinicultura gaúcha, a Sociedade Vinícola Rio-Grandense ou Companhia Vinícola Rio-Grandense.
Apesar de sua fundação não ter pacificado o setor (muito pelo contrário), a Companhia foi quem deu força a vitivinicultura gaúcha, levou o vinho nacional ao exterior e engarrafou a primeira produção de vinhos varietais finos, sob o rótulo Granja União.
Mas, o que tem a ver uma das maiores vinícolas brasileiras com o personagem vitivinícola desse mês? Pois, nosso homenageado, Danilo Callegari, trabalhou como diretor técnico da Companhia por mais de 45 anos. Engenheiro agrônomo formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul teve seu trabalho reconhecido com o recebimento do Troféu Vitis – Destaque Enológico durante a Avaliação Nacional de Vinhos de 1999 e a denominação da via pública com seu nome no bairro Nossa Senhora da Saúde, em Caxias do Sul.
Nascido em 23 de maio de 1917, em Bento Gonçalves, era filho de Fernando Callegari e Sidia Simon Callegari. Os primeiros anos escolares foram cursados na localidade da Linha Paulina, ainda em Bento Gonçalves. Mas, ainda adolescente, mudou-se para Porto Alegre para continuar com os estudos no Colégio Anchieta. Permaneceu na capital até a conclusão do curso superior em Agronomia pela Escola de Agronomia e Veterinária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Conforme conta a filha Rita Callegari Basso, pelo Ministério da Agricultura fez o curso de Enologia no Rio de Janeiro, sendo o “primeiro filho de viticultor, no
Brasil, a formar-se nesta escola”.
Iniciou sua vida profissional em 1938, aos 21 anos, logo após se formar. No ano seguinte, foi credenciado como enologista e depois agrônomo-chefe do Laboratório Central de Enologia do Ministério da Agricultura, no Rio de Janeiro. Em 1940, mudou-se para a cidade natal Bento Gonçalves, onde foi nomeado diretor da Subestação de Enologia – atual Embrapa Uva e Vinho. Foi ali que conheceu a professora de educação física Gemma Martinato, com quem se casou em 1945. Juntos tiveram os filhos Sidia Maria, Fernando José e Rita Maria, que lhes deram oito netos.
Durante a Segunda Guerra Mundial, foi convocado para o trabalho ativo do Exército Brasileiro, entre os anos de 1943 a 1945. Prestou serviços em Caxias do Sul no 9° Batalhão de Caçadores, como oficial R/2 de infantaria, nos postos de 2° e 1° tenente, com referências elogiosas pela sua dedicação ao exército.
Na Itália e na França, ainda, passou seis meses estudando com professores renomados, como Dalmasso Conegliano e Ribereu-Gayon, sobre a microbiologia do vinho. Nessa época, já havia sido transferido como diretor da Estação Experimental de Caxias do Sul. Ficou na função até 1947, quando foi contratado para as
funções de técnico em enologia na Cia. Vinícola Rio-grandense. Em 1978, foi eleito diretor-técnico, cargo em que permaneceu até a desativação da empresa, na metade da década de 1990.
Destaque
Pelos quase 50 anos que permaneceu na Cia. Vinícola Rio-Grandense acompanhou todos os altos e baixos da cantina, como a expansão da empresa, as primeiras exportações, as plantações das castas finas, o nascimento da marca Granja União, a liderança no mercado, as brigas com as cooperativas vinícolas, as parcerias multinacionais, até a derrocada final em 1998. Foi o engenheiro que, na década de 1970, ajudou a desenvolver o suco de uva concentrado para o uso de bebidas, como o refrigerante. A fórmula feita chegou ao suco de uva sulfitado, que deu origem ao suco industrial.Contribuiu para os projetos da empresa como o da Serra do Sudeste. Junto com o também engenheiro Onofre Pimentel coordenou a importação de 150 variedades europeias e incrementou os viveiros da Granja União, em Flores da Cunha. Os dois foram os responsáveis pelos grandes vinhos no auge da empresa e também os que mantiveram a linha de vinhos finos durante a década de 1980, quando a crise começava a atingir a vinícola.
Além do trabalho dentro da Cia. Vinícola Rio-Grandense, Danilo representou o Brasil em diversas oportunidades, integrando comissões técnicas da Organização Latino-Americana da Uva e do Vinho – Olavu. Contribuiu de maneira destacada para o desenvolvimento da vitivinicultura, por meio de viagens de estudo aos países da Europa e da América Latina, buscou o aperfeiçoamento profissional e transferiu os conhecimentos para o crescimento dos setores da uva e do vinho.
Além da vida profissional, ingressou no movimento leonístico internacional como sócio efetivo do Lions Clube Caxias do Sul, em 1960. Na entidade, destacou-se por suas atividades na área sócio-educativa-comunitária, tendo sido um colaborador ativo na criação da Escola Melvin Jones. Foi presidente da entidade e também vice-governador do Distrito LD-7.
Atuou ainda como coordenador de pastorais, administrador de bens patrimoniais e ministro da eucaristia.
Tinha forte presença junto aos religiosos da Paróquia de São Pelegrino e costumava levar conforto, palavras de animo e fé aos doentes e idosos. Desenvolveu intensa atividade como organizador da Fundação Caxias, da qual foi presidente, buscando recursos para que a entidade pudesse
cumprir com suas finalidades estatutárias de apoio às entidades assistenciais, como o Lar São Francisco e a Escola Helen Keller.
Nas horas vagas costumava jogar bridge. “Foi campeão muitas vezes, sendo detentor de muitas medalhas nesse esporte”, relata a filha Rita Callegari Basso. Faleceu em 2 de outubro de 2002, em Caxias do Sul.
Durante a exposição de motivos para a denominação da rua que levava seu nome, o então vereador Getúlio Paulo Demori (PP), escreveu: “foi uma pessoa constantemente preocupada em servir seus semelhantes. Modesto por formação, cortês e sereno, era admirado por todos que com ele conviveram”.
Fontes: filha Rita Callegari Basso/ Projeto de Lei de denominação de rua da Câmara de Vereadores de Caxias do Sul/ Livro Memórias do Vinho Gaúcho, de Rinaldo Dal Pizzol e Sérgio Inglez de Sousa.
Final
Com a história de vida e trabalho de Danilo Callegari finalizamos a primeira edição da série ‘Eles Marcaram a História – Personagens da Vitivinicultura Brasileira’. Sugestões de nomes de pessoas que colaboraram com o crescimento do setor podem ser enviadas para mirian@avindima.com.br.
Danúbia Otobelli / Especial
Respostas de 3
Que bacana a reportagem!
Tive o prazer de conhecer Seu Danilo, pois sempre foi amigo proximo do meu avô Adilio Cipriani.
Linda a homenagem!
Como contribuicao, sugiro o nome do falecido Moacir Dias, de Caxias do Sul. Foi por muitos anos o responsavel pela estação experimental da EMPRABA.
Muito legal a reportagem!
Trabalho no Arquivo Histórico Municipal João Spadari Adami, de Caxias do Sul, há algum tempo classificando toda a documentação, doada por Luiz Carlos de Oliveira, da grande “Sociedade Vinícola Rio Grandense Ltda.”.
Essa reportagem será utilizada como base para determinação de datas de alguns acontecimentos que envolveram a Vinícola e na elaboração da biografia deste grande profissional, bem como as matérias sobre o Sr. José de Moraes Vellinho, o Sr. Mandelli e o Sr. Kunz.
Danúbia: você tem contato com os familiares destas lendas da vitivinicultura? Será que eles não teriam interesse de doar documentos e fotos deles à nossa Instituição?
Obrigada e continuem com esse trabalho maravilhoso!
Adorei a trajetória do Sr. Danilo Gallegari, muito interessante saber de histórias verdadeiras e com um certo grau de maestria e capacidade.
abraços…
Carlos Sindona .’.