No final dos anos de 1970, o italiano Francesco Reti questionado durante uma entrevista para a Gazeta Mercantil sobre o que sentia orgulho, respondeu: “a inscrição indústria brasileira nos mais diversos produtos”. Segundo seu filho, o jornalista Jorge Reti, Francesco era assim: um italiano que se orgulhava do trabalho vitivinícola realizado nas terras tupiniquins. Francesco foi presidente e fundador da empresa italiana Martini & Rossi no Brasil – desde 1993 Bacardi Martini do Brasil.
Filho de Giulio Reti e Ada Calic Blasic Reti, Francesco nasceu em 13 de dezembro de 1909, na cidade de Fiume, na Itália. Em 1923, a família se muda para a cidade de Trieste, onde Francesco inicia a Faculdade de Economia e Contabilidade, que não chegou a concluir, pois muda-se para a América Latina. Aos 22 anos, ele deixa a Itália rumo a Buenos Aires, na Argentina, e ingressa como auxiliar da área de contabilidade na Martini & Rossi. No ano de 1949, é nomeado presidente da empresa no Brasil com uma incumbência desafiadora: instalar a fábrica da Martini & Rossi no país. A companhia inicia suas atividades em São Paulo, em 1951, quando começa a produção e a distribuição dos clássicos vermutes rosso, bianco e dry. Com a fabricação de vermutes também inicia-se a parceria com cooperativas do Rio Grande do Sul. No ano de 1968, a Martini & Rossi faz seu primeiro investimento na Serra Gaúcha e dá o pontapé para diversos fatos inovadores da história da vitivinicultura gaúcha e brasileira.
Em janeiro de 1973, esse passo é consolidado com a instalação da Matini & Rossi em Garibaldi, iniciando a nova divisão de vinhos e espumantes da vinícola. É de lá que saíram o espumante De Gréville e o vinho Baron de Lantier, considerados ícones da época. Juntamente com o Chandon, o espumante se tornou o mais caro e de qualidade do país.
Mas, antes disso o poliglota (falava português, italiano, vêneto, espanhol, francês e serbo-croato) e inovador Francesco foi até a Argentina convidar o jovem enólogo Adolfo Lona, então com 24 anos, para trabalhar nesse novo projeto da Martini & Rossi em Garibaldi. Lona foi selecionado entre dezenas de enólogos argentinos que almejavam trabalhar na empresa.
Consolidada em Garibaldi, a Martini & Rossi, sob o comando de Francesco, ergue uma segunda unidade industrial. Para essa nova fábrica foi levada a recepção das uvas, a elaboração, a conservação e a tipificação de todos os vinhos. Dos 150 produtores iniciais de uva, a empresa saltou para 1.100 viticultores, que entregavam até 150 toneladas por safra.
Inovações certeiras
Apesar do sucesso da Martini & Rossi, a grande contribuição de Francesco para o mundo vitivinícola nacional foi uma série de inovações para o setor e que se mostraram fundamentais para a qualidade dos vinhos e espumantes do Rio Grande do Sul. A Martini & Rossi/ De Lantier introduziu, em 1974 – inovações feitas depois por outras vinícolas -, a caixa plástica para o transporte da uva, que seria um divisor de águas na qualidade das frutas que chegavam as cantinas. Nessa mesma época, a empresa também adotou a vistoria nas propriedades e uma forma de recebimento das uvas com pré-agendamento para evitar misturas indesejáveis das variedades. O preço foi outro quesito inovador. A empresa passou a pagar mais pelo produto de qualidade, dando preferência para as uvas sem folhas, maduras e selecionadas. “Em diversas safras a De Lantier foi a empresa a pagar os preços mais altos aos produtores. Nesse aspecto, Humberto Lotti teve um papel de destaque, pois era ele quem insistia com meu pai e com o Lona de que era necessário pagar mais”, escreveu Jorge Reti.
O pioneirismo também ocorreu em outros pontos, como a importação de mudas da França com certificação e sem viroses. Outras vinícolas já importavam plantas, mas a Martini & Rossi acelerou o processo trazendo variedades de Cabernet Sauvignon, Merlot, Pinot Noir, Riesling, Chardonnay e Semillon. A redução da produção por pé e área, a restrição no uso de fertilizantes e a implantação de um maquinário moderno também foram iniciativas adotadas pela empresa comandada por Francesco.
‘Viva o Brasil’
O espírito inovador de Francesco Reti o levou a algumas histórias ‘aventurescas’. Conforme o filho, Jorge Reti, em 1959, em virtude da conclusão da rodovia Belém-Brasília “totalmente de terra, quando poucos se aventuravam a transitar por lá, Francesco mandou dois funcionários, dizendo: ‘precisamos chegar antes da concorrência”. O objetivo era colocar placas publicitárias em postes e fazer contatos com possíveis clientes. Foram enviados dois representantes em um jipe. Mas, em 1959, não havia postes, nem rodovia e nem energia elétrica. Quanto aos clientes também não foram encontrados, pois eram pouquíssimos ‘botecos’ e ‘hotéis’. “Enfim, essa primeira investida na Belém-Brasília foi tão pioneira, que dessa vez não deu certo. Os dois voltaram, relatando todas as aventuras e na falta dos postes pregaram as placas nas árvores ao longo da rodovia”, conta Reti.
Apreciador de vinhos, foi também um defensor da bebida produzida nacionalmente. Em 1965, ao receber o título honorífico Ufficiale do governo italiano, o cônsul da Itália brindou aclamando: ‘Vila l’tália’, Francesco respondeu ‘Viva il Brasile e l’Itália”, frisando o destaque antes para o país que o havia adotado. Além da menção, também recebeu o Commendatore, concedido também pelo Governo da Itália em reconhecimento ao papel desempenhado por ele na economia e na industrialização do Brasil.
Francesco ficou no comando da Martini & Rossi até 1980, quando se aposentou. No ano de 1982, ingressou como consultor da presidência da empresa, função que exerceu até 1986. Foi casado com Maria Teresa Bonte Reti com quem teve dois filhos – Landa Reti Lalli e Jorge Reti. Francesco faleceu em 1º de setembro de 1988 deixando um legado de ensinamentos para a vitivinicultura nacional.
Fonte
Curriculum elaborado por Jorge Reti.
Por Danúbia Otobelli