Destilado oriundo de bagaço, um subproduto do processo de vinificação, é característico da região serrana do Rio Grande do Sul e serve como excelente aperitivo
Graspa, grappa ou bagaceira. Uma bebida de origem italiana, na legislação brasileira tem graduação alcoólica de 38º a 54º GL, obtida do destilado alcoólico simples de bagaço (peles, sementes e caroços) de uva fermentado. Encontrada, principalmente, nos porões dos pequenos produtores de uva da Serra Gaúcha, a graspa mantém na maioria dos casos um método de elaboração artesanal, conservando o bouquet da variedade da uva o qual o bagaço tem origem. Com essa qualidade crescente na elaboração, hoje a graspa deixou de ser um produto ‘espanta frio’ – antigamente a bebida era mais agressiva e rústica em sabor e era usada pelos soldados para se aquecerem no inverno –, para se tornar um destilado de luxo.
Assim ocorre na propriedade do produtor rural Renato Lovatel, no interior de Flores da Cunha. Ele herdou do pai, Luiz Lovatel, o método de elaboração da graspa e, de uma dificuldade com a comercialização das uvas, há mais de 20 anos resolveu investir no alambique da família. Estudou, fez cursos, buscou métodos próprios para facilitar o trabalho e hoje já tem na La Grappa Licores e Destilados o principal rendimento econômico da família – que trouxe, ainda, o turismo para o local em meio aos vales do distrito de Mato Perso. “Hoje a destilação do bagaço da uva e o turismo já representam o carro chefe da economia familiar aqui em casa. Com o passar dos anos, fomos agregando os licores e o nosso primeiro conhaque está quase pronto”, adianta o Lovatel. A La Grappa está inserida no Roteiro Caminhos da Colônia e na Associação de Turismo da Serra Nordeste (Atuaserra). Toda a produção, que gira em torno de 2 mil litros por ano, é engarrafada e vendida na propriedade.
A La Grappa Licores e Destilados fica na Capela São Tiago, no distrito de Mato Perso, interior de Flores da Cunha. Além da graspa tradicional, sua linha conta com graspa com funcho e licores de uva, butiá e ameixa. Informações em (54) 3026.6758, pelo e-mail lagrappa@bol.com.br ou na página no Facebook.
O destilado mais famoso da Itália
Em um país reconhecido pelo seu vinho, é natural que muito da sua cultura esteja relacionada à bebida e, além disso, outras tenham a mesma raiz. Os diversos dialetos italianos atribuem diferentes grafias à graspa: grappa na Lombardia, rapa no Piemonte e graspa no Vêneto. Esta última é a mais utilizada no Brasil, provavelmente porque os imigrantes italianos que colonizaram a Serra Gaúcha, na sua maioria, são oriundos dessa região.
Inicialmente, a destilação do bagaço era feita para a produção de álcool, com a finalidade farmacológica. Somente mais tarde foi utilizada para a produção da graspa. Por volta de ano de 1.400 já havia indicação da produção de graspa na região de Friuli, na Itália, no entanto, somente depois, com a utilização de destiladores equipados com retificadores, é que a elaboração do destilado foi aperfeiçoada.
No Brasil, as poucas referências históricas da graspa datam do final do século passado, pelos imigrantes italianos na Serra Gaúcha. Hoje, pouquíssimas empresas se dedicam a essa atividade, e muitos dos pequenos produtores, agricultores que faziam a graspa, deixaram de produzi-la em função do baixo rendimento da produção, além da dificuldade de estocar o bagaço. Felizmente esse não é o caso do empreendedor Renato Lovatel, que ano após ano vê na graspa um verdadeiro negócio.
A elaboração
O alambique é composto por uma caldeira, onde é depositado o material a ser destilado, como o bagaço; o capitel, que fecha a parte superior da caldeira; o colo de cisne, condutor que conduz o vapor alcoólico do capitel até a serpentina, que está mergulhada em um reservatório de água fria corrente. Nesta parte os vapores passam, se condensam e são recolhidos como destilado.
Na propriedade de Renato Lovatel, o bagaço é adquirido de vinícolas próximas. O material é depositado em tanques onde fica armazenado durante todo o ano. Para iniciar o processo, o bagaço é depositado na caldeira juntamente com água. “Em fogo baixo ocorre a primeira destilação da graspa. O destilado obtido nesta etapa é armazenado em um recipiente adequado até alcançar um volume necessário para efetuar a segunda destilação”, explica Lovatel. Geralmente o bagaço utilizado é de uvas tintas. As variedades brancas rendem menos no processo de destilação, mas são as que mais ganham no bouquet final.
A segunda destilação é lenta e ocorre somente após uma limpeza criteriosa no alambique. “Onde antes estava o bagaço, agora é depositado o destilado. Nesta fase, para garantir a qualidade da graspa, separamos as diferentes partes do destilado: cabeça, coração e cauda. O coração é a porção mais importante do destilado, pois apresenta a maior quantidade de álcool etílico e a menor proporção de componentes secundários como impurezas”, explica o produtor. Cada 100 kg de bagaço rendem, em média, de 10 litros de graspa, com graduação alcoólica de cerca de 50º GL. Esse rendimento é variável em função do tipo de bagaço e das condições de armazenamento. O primeiro processo, com o bagaço, dura cerca de três horas. As etapas seguintes de destilação duram de oito a 10 horas (confira no portal da Bon Vivant um vídeo que mostra as etapas da elaboração da graspa).
Embora trabalhosa, a rotina de fazer graspa está nos planos de Lovatel por muitos anos. Ele vem percebendo uma demanda crescente e recebe até pedidos especiais, feitos através de bagaço de outras uvas, como a Moscato Giallo. “Além disso, nos últimos anos, com a qualificação das vinícolas, que prensam menos o bagaço, valorizando mais a qualidade do vinho, essa matéria-prima vem rendendo mais também no alambique. Nossa graspa tem como principal característica o método artesanal, feita com muito carinho e dedicação”, valoriza Lovatel que aposta: “A graspa é uma bebida que convida ao drink com amigos. Seja para fazer uma caipirinha ou como um aperitivo único”.
CONFIRA UM VÍDEO SOBRE A ELABORAÇÃO DA GRASPA NA PROPRIEDADE DE RENATO LOVATEL