Estação apresentou condições positivas para a brotação, que, contudo, pode ser prejudicada em decorrência do excesso de chuva no ciclo anterior
Recentemente findado, o inverno deste ano foi favorável para a brotação da videira, na Serra Gaúcha, indicam os dados da estação agroclimatológica da Embrapa Uva e Vinho, em Bento Gonçalves. No entanto, por conta da condição fitossanitária ruim no ciclo anterior, o potencial de produção poderá apresentar alguma irregularidade, ressalva o pesquisador da instituição Henrique Pessoa dos Santos.
A estação registrou um acúmulo de 388 horas de frio (com temperaturas menores ou iguais a 7,2ºC) de 1º de abril a 21 de setembro de 2010. A normal climatológica, no período de 1º de abril a 30 de setembro, levando em conta os registros de 1976 a 2009, é de 408 horas/frio (confira gráfico abaixo). Ou seja, com apenas 20 horas/frio a menos do que o padrão – e nove dias a menos na contagem – o inverno deste ano, em termos quantitativos, se apresentou normal, sem influências negativas para a videira. “Portanto, com base apenas na quantidade de frio, a estação atendeu perfeitamente às exigências de frio hibernal para a superação da dormência das gemas e a garantia de uma brotação uniforme, independente da cultivar”, assinala Pessoa dos Santos.
Do ponto de vista qualitativo, o inverno também foi favorável para a brotação, principalmente pela ausência de temperaturas elevadas, que podem estimular a brotação, no meio do inverno, de cultivares precoces e menos exigentes quanto ao frio (como a Chardonnay). Neste ano, o frio apresentou uma evolução distinta da normal climática, sendo mais tardio: iniciou em maio e teve os meses de julho e agosto como os mais frios, quando o padrão é o começo em abril e o auge do frio em junho e julho (confira gráfico ao lado). Outra característica importante do inverno de 2010 é a redução de horas de frio em setembro, em relação à normal climática, condição que favorece a uniformização da brotação e o crescimento inicial, anota o pesquisador da Embrapa Uva e Vinho.
Confirmando-se as previsões em relação à brotação, a etapa seguinte do ciclo, a floração, poderá apresentar também um período mais curto de ocorrência – e sob alerta. É que o acontecimento de chuva, mesmo que leve, mas coincidente com esse momento, representa um risco maior, pela maior uniformidade de desenvolvimento das flores. No contexto, destaca-se a importância de se investir na diversidade de cultivares na propriedade, para minimizar esse tipo de risco na produção, principalmente com a distinção de ciclos (precoce, intermediário ou tardio).
Além disso, anota Pessoa dos Santos, a capacidade de produção da videira poderá apresentar alguma irregularidade nesse ciclo em função da condição fitossanitária adversa, provocada pelo excesso de chuva, no ciclo anterior. Neste, o volume de precipitação foi 61,8 % maior do que a média (1.699,6 milímetros de chuva no período de setembro de 2009 a março de 2010, quando a normal climatológica, para o período, é de 1.032 milímetros). Esse quadro pluviométrico, observa o pesquisador da Embrapa Uva e Vinho, restringiu a superfície foliar da videira e sua atividade, como decorrência do ataque de doenças e do grande sombreamento das plantas pelos dias nublados. Assim, o acúmulo de reservas para este ciclo, o 2010/2011, pode ter sido reduzido, principalmente nos parreirais em que a queda foliar foi mais drástica e antecipada.
Com essa restrição de reservas, o vigor do crescimento inicial nesta primavera poderá se apresentar menor em relação ao ciclo anterior, principalmente nas plantas que foram mais atingidas por doenças, explica Pessoa dos Santos. Além disso, a fertilidade de gemas nas plantas mais atacadas no ciclo anterior pode ter sido comprometida, ocorrendo, neste ciclo, brotações com menor número de cachos ou menor número de flores por cacho, acrescenta.
De modo geral, pontua o pesquisador, “o potencial de produção desta safra poderá ficar dentro da média se as condições meteorológicas nos próximos meses forem favoráveis – com restrição de chuvas – ao florescimento (em outubro e novembro) e à maturação (de dezembro a março), para garantir a máxima conversão de flores em uva e que estas não sejam perdidas por problemas fitossanitários”. A expectativa pode ser atendida: de acordo com o Conselho de Agrometeorologia do Rio Grande do Sul, coordenado pela Secretaria Estadual da Agricultura, Pecuária, Pesca e Agronegócio (Seappa), o prognóstico para esse segundo semestre é de restrições de chuvas, por conta da ocorrência do fenômeno climático La Niña.
Foto: Andréia Debon / Arquivo Editora Novo Ciclo
Registro do frio deste ano na Serra Gaúcha – em Flores da Cunha.