A afirmação de que “os produtores de vinho estão perdendo na briga do discurso se o vinho faz mal ou bem à saúde” tornou-se um alerta urgente para o setor vitivinícola brasileiro. A provocação foi feita pelo cardiologista Jairo Monson de Souza Filho durante painel no Fórum Mundial de Cooperativas Vitivinícolas. Ao lado da biomédica Caroline Dani, presidente da Associação Brasileira de Sommeliers do Rio Grande do Sul (ABS-RS), Monson defendeu que o setor precisa assumir um papel mais ativo para reposicionar o vinho no imaginário coletivo, destacando os benefícios comprovados do consumo moderado.
Segundo o cardiologista, há um consenso científico sobre os benefícios do consumo moderado de vinho, especialmente em relação à proteção cardiovascular, resistência à insulina e outros marcadores metabólicos. Estudos de alto nível, como metanálises e revisões sistemáticas, têm demonstrado efeitos protetores importantes associados à ingestão regular e moderada da bebida.
“Os produtores de vinho estão perdendo na briga do discurso se o vinho faz mal ou bem à saúde. A opinião pública está sendo moldada por estudos inconsistentes e por mensagens alarmistas, enquanto a ciência robusta está sendo pouco divulgada”, alerta Monson.
De acordo com o médico, há uma dificuldade inerente aos estudos clínicos envolvendo o consumo de bebidas alcoólicas — como a impossibilidade de criar grupos duplo-cegos, onde nem os participantes, nem os pesquisadores sabem quem está consumindo o quê.
Ainda assim, os dados disponíveis, quando analisados com rigor estatístico, mostram que o vinho, diferentemente de outras bebidas alcoólicas, possui propriedades específicas e positivas graças à presença de polifenóis e antioxidantes naturais.
“Vocês, produtores, têm uma arma muito poderosa: a evidência científica. Mas não estão sabendo usá-la. O espaço público está sendo ocupado por quem desinforma”, reforçou Monson.
A biomédica Caroline Dani, referência internacional nos estudos sobre os efeitos do vinho e da uva na saúde, complementou a fala de Monson com um chamado à ação. “A informação é a melhor aliada dos produtores para enfrentar a falácia contra o vinho”, pontuou.
Além disso, Caroline apresentou dados sobre as chamadas Blue Zones — regiões do mundo com alta concentração de pessoas centenárias e com qualidade de vida elevada. Segundo ela, entre os nove fatores comuns dessas populações para alcançar a longevidade está justamente o consumo moderado de vinho. Esse dado reforça a visão de que o vinho, inserido em um contexto alimentar e cultural adequado, pode ser benéfico para a saúde e a longevidade.
Dados científicos comprovam: o vinho se diferencia
Monson apresentou ainda evidências científicas contundentes que reforçam os benefícios exclusivos do vinho em comparação a outras bebidas alcoólicas. Ele citou o conhecido estudo Greenback, que causou grande impacto ao demonstrar que o consumo moderado de bebidas alcoólicas apresentava uma curva de proteção até 3 a 4 drinks por dia. No entanto, anos depois, ao separar os tipos de bebida, constatou-se que apenas o vinho manteve a proteção, enquanto as demais — como cerveja e destilados — não apresentaram mais esse efeito.
“O vinho mostrou uma redução significativa no risco de mortalidade, enquanto a cerveja não e, inclusive, o destilado, quando consumido em maiores quantidades, elevou o risco”, explicou Monson.
Esse efeito positivo, segundo ele, está relacionado à alta concentração de polifenóis no vinho, que possuem forte capacidade antioxidante. Além disso, o vinho favorece a diminuição da resistência à insulina, melhora os fatores de coagulação e eleva os níveis de colesterol bom (HDL).
“Todas as bebidas alcoólicas podem ter efeitos globais sobre o metabolismo, mas o vinho possui polifenóis que potencializam esses efeitos e, em alguns casos, apresentam benefícios exclusivos”, destacou.
Monson também apresentou uma das metanálises mais robustas já realizadas, que analisou 74 estudos clínicos com mais de 4 milhões de pacientes. Entre esses, 47 estudos apontaram efeitos protetores do consumo moderado de vinho, 26 foram neutros e apenas um mostrou um resultado adverso, restrito a mulheres em um contexto muito específico. Nenhum estudo apontou danos consistentes relacionados ao consumo moderado.
“Essa é a evidência mais robusta que temos atualmente: não há associação entre consumo moderado de vinho tinto e desfechos negativos para a saúde. Embora a revisão não tenha como objetivo promover o consumo, ela busca evitar que o consumo moderado seja desencorajado com base em estudos inconsistentes que não distinguem entre tipos de bebidas”, afirmou.
Monson reforçou que, para cada nove estudos que mostraram benefícios, apenas um apresentou resultado negativo, e frequentemente baseado em metodologias questionáveis.
“A opinião pública hoje está sendo guiada por discursos com baixo peso científico, enquanto vocês, produtores, têm uma arma muito poderosa — a ciência robusta — e não estão sabendo usá-la. Estão perdendo essa batalha para quem não tem uma arma boa e, mesmo assim, está vencendo a opinião pública”, alertou.
Ciência, cultura e mercado: o papel estratégico do produtor
O painel também reforçou que o vinho, diferentemente de outras bebidas, sempre esteve historicamente ligado à saúde. Ambos os especialistas ressaltaram que a disputa atual vai além do campo científico: trata-se de uma disputa cultural e mercadológica.
Com o consumo de vinho no Brasil em expansão — cada vez mais associado a novos públicos, atraídos por e-commerce e supermercados —, torna-se ainda mais urgente reposicionar a bebida no debate público.
Para Jairo Monson, esse é um convite para que produtores, associações e cooperativas sejam mais proativos. “Não se trata de incentivar o consumo indiscriminado, mas de defender o consumo responsável, com base em evidência científica. O setor não pode mais ficar passivo enquanto perde espaço para narrativas distorcidas”, concluiu.
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