A sustentabilidade deixou de ser apenas uma tendência para se consolidar como diferencial competitivo no setor do vinho — especialmente em um contexto global que se volta, cada vez mais, para o combate às mudanças climáticas. Esse foi o foco da palestra “Vinhos de Baixo Carbono – Uma Oportunidade de Mercado”, realizada durante a programação técnica da Wine South America, e que reuniu especialistas para discutir a jornada de descarbonização da cadeia produtiva da vitivinicultura brasileira.

Com a COP 30 se aproximando e o Brasil no centro das atenções globais em temas ambientais, o painel reforçou a necessidade do setor vitivinícola alinhar suas práticas produtivas aos princípios da sustentabilidade climática, com foco na redução da emissão de gases de efeito estufa, adoção de práticas regenerativas e valorização de todo o ciclo produtivo – do solo ao consumidor.

De acordo com dados apresentados por Rogério Melo, CEO da AgroTema e advisor da UPL, 72% dos consumidores europeus preferem produtos com menor pegada ambiental, e os vinhos considerados sustentáveis crescem 2,5 vezes mais rápido do que os convencionais. No entanto, ele alerta para um gargalo de comunicação.

“Produzimos com responsabilidade, com bom impacto ambiental, mas ainda não sabemos contar bem essa história. Sustentabilidade não é um princípio abstrato, nem é sobre ‘abraçar árvores’. É sobre equilibrar o social, o ambiental e o econômico. O desafio agora é fazer o storytelling certo,” pontuou.

Melo apresentou uma jornada de sustentabilidade que inclui manejo regenerativo do solo (com sequestro de carbono), uso de energia limpa na vinificação, embalagens com menor impacto ambiental e logística inteligente. Segundo ele, empresas vinícolas que conseguirem comunicar esse compromisso durante a COP 30 terão espaço privilegiado no mercado.

Um dos exemplos nacionais é o da vinícola Guatambu, localizada em Dom Pedrito, na Campanha Gaúcha. A empresa já iniciou o processo de testes para obter o certificado de vinhos de carbono neutro, o que a posiciona na vanguarda da produção sustentável no país.

Complementando a visão empresarial, Jackson Brilhante de São José, coordenador do Comitê Gestor do Plano ABC+ RS (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono) e pesquisador da Secretaria da Agricultura (Seapi), reforçou a importância da medição e monitoramento das emissões, com atenção especial ao papel do solo como principal reservatório de carbono.

“Mais de 90% do carbono está no solo. O produtor precisa entender que o sequestro de carbono depende das escolhas que faz. O manejo adequado, a cobertura vegetal e até a integração com ovinos em parreirais contribuem para tornar o solo mais resiliente e produtivo”, explicou.

O painel também destacou a importância de bioinsumos, fertilização consciente e coletas profundas do solo, que permitem avaliar com precisão o estoque de carbono em até um metro de profundidade. Além disso, práticas como a utilização de créditos de carbono REED+ da Amazônia foram apontadas como uma oportunidade concreta para agregar valor e posicionar o vinho brasileiro no debate ambiental global.

Consumidor quer sustentabilidade — e paga por ela

Com os vinhos de baixo carbono ganhando reconhecimento internacional e os consumidores cada vez mais atentos à origem dos produtos, o painel concluiu que a sustentabilidade pode e deve ser usada como ativo de valor. Mais do que uma obrigação regulatória, trata-se de uma narrativa que conecta o campo ao consumidor final, com potencial de abrir portas em mercados exigentes.

Na esteira dos debates da COP 30, a Wine South America mostra que o vinho brasileiro tem as condições ideais para se consolidar como exemplo de sustentabilidade — desde que saiba contar sua história de forma clara, científica e cativante.