Um lugar para a Pinot Noir

Estudos da Embrapa Uva e Vinho apontam que região dos
Campos de Cima da Serra é promissora para o cultivo da variedade

Página 4 - uva Pinot NoirQuem assistiu ao filme norte-americano Sideways – Entre umas e outras, sabe que a Vitis vinífera Pinot Noir  não é uma cultivar fácil. Num determinado momento do longa, o personagem principal a descreve como a “uva, considerada pelos vinhateiros como a do cultivo mais complicado”. Pois parece que a variedade encontrou na região gaúcha dos Campos de Cima da Serra um lugar ao sol. Pesquisas recentes apontam a região como um dos novos pólos vitivinícolas do país e a Pinot Noir como uma uva próspera dessa localidade. “Nossos vinhos são jovens no mercado, mas possuem uma característica diferenciada que a região do Campos de Cima da Serra permite, como é o caso do Pinot Noir que aqui se adaptou muito bem”, pontua o empresário Agamenon Lemos de Almeida, que há quatro anos resolveu investir na produção de viníferas no município de Muitos Capões. Numa área de 12 hectares, ele cultiva variedades como Merlot, Chardonnay, Sauvignon Blanc e, claro, a Pinot Noir.
Mas, a que se deve a boa adaptação de uma uva considerada difícil de cultivar? Pesquisas realizadas pela Embrapa Uva e Vinho, que desde 2004 conduz experimentos nas áreas de viticultura e enologia na região, têm indicado condições favoráveis devido ao solo e ao clima.
Os Campos de Cima da Serra estão situados a uma altitude entre 900 a 1.100 metros, sobre solos de origem basáltica e com influência oceânica variável sobre o clima, com noites frias e dias mais amenos. Nessas condições, o ciclo de produção das videiras é longo, podendo chegar a três meses para as cultivares tardias.
Conforme o pesquisador em enologia da Embrapa Uva e Vinho, Celito Crivellaro Guerra, as cultivares Vitis vinifera apresentam diferentes graus de adaptabilidade às condições naturais das regiões onde estão implantadas. Com isso, as variedades recebem três distinções: ‘cosmopolitas’ para as castas que possuem alto potencial enológico em condições naturais; ‘intermediárias’ para aquelas que têm potencial enológico variável em função das condições; e ‘particulares’ para aquelas que tem alto potencial enológico apenas em condições naturais muito específicas. Nessa última se enquadraria a variedade Pinot Noir nos Campos de Cima da Serra. “Estudos têm ressaltado o potencial para a produção de vinho tinto de alta qualidade. Assim, na safra 2012 foram testados parâmetros específicos na fase de maceração, usando o sistema de fermentação em barricas giratórias, conhecido como vinificação integral. A qualidade do vinho foi medida através de análises químicas e sensoriais. Os melhores vinhos apresentaram como diferenciais: maior qualidade dos taninos, intensidade da cor, total de polifenóis, estrutura e harmonia olfato/gustativa”, explica o pesquisador.
Apesar dos resultados parciais, as pesquisas já indicam o futuro promissor que a uva Pinot Noir tem na região. “Os vinhos elaborados com uvas de alto potencial enológico, como o Pinot Noir com uvas dessa região, parecem responder mais intensamente à tecnologia enológica do que vinhos originados de uvas de menor potencial. É provável que o vinho Pinot Noir, pelos atributos que tem demonstrado nos ensaios conduzidos, transforme-se brevemente em um vinho emblemático da região”, afirma Guerra.
Segundo ele, vinhos elaborados pelas uvas dos Campos de Cima da Serra resultam numa bebida encorpada, madura, untuosa, elegante, harmônica e com teor alcoólico moderado. “Os tintos são ricos em matéria corante e em taninos. O aroma é complexo, com mescla de notas vegetais, frutadas, de doces de frutas e especiarias”, esclarece o pesquisador.

Revezar a produção entre a uva e a soja

Embora os resultados sejam recentes, muitos empresários – não necessariamente vinculados ao setor vinícola – têm investido na região dos Campos de Cima da Serra. Pelo menos cinco produtores já plantam vinhedos nessas terras. Caso do empresário Agamenon Lemos de Almeida, que há quatro anos optou por revezar sua produção entre a uva e a soja. Na Fazenda Santa Rita, ele plantou 12 hectares das viniferas Pinot Noir, Merlot, Chardonnay e Sauvignon Blanc. Esse é o segundo ano que Agamenon lança os vinhos elaborados com uvas da região. No mercado já circulam sete produtos, incluindo dois vinhos Pinot Noir. Até outubro, ele deverá lançar dois espumantes, também utilizando a variedade.
E a escolha por plantar a Pinot Noir veio, justamente, das pesquisas prósperas sobre a cultivar no paralelo 28 S. Sua propriedade já havia servido de base para estudos estrangeiros sobre a potencialidade do cultivo de videiras no local. “Antes de escolher as castas para plantar, já havia me informado sobre as variedades que melhor se adaptavam e investi na Pinot Noir porque os estudos apontavam um bom potencial. E os vinhos têm comprovado isso”, diz o empresário. Em breve, ele deverá construir sua própria vinícola, por

Empresário Agamenon de Almeida investiu na Pinot Noir. ( Foto: Ricardo BAMPI/Divulgação)
Empresário Agamenon de Almeida investiu na Pinot Noir. ( Foto: Ricardo BAMPI/Divulgação)

enquanto suas uvas são cultivadas nos Campos de Cima e vinificadas na Serra Gaúcha.
O vinicultor José Sozo, da Sozo Vinhos Finos, também investiu na Pinot Noir. No município de Monte Alegre dos Campos ele cultiva dois hectares da variedade e com bons resultados. “A consequência de um bom Pinot é o clima daqui: uma zona alta e fria. O Michel Rolland (enólogo francês) disse que nunca vamos conseguir fazer um Pinot em zonas quentes e concordo com ele. No ano passado, levei três Pinot meus para a Borgonha e eles me disseram que tinha a mesma expressão dos produzido lá”, conta.
Se o clima favorece a coloração das uvas e maturação dos taninos, ele também influencia na fragilidade da variedade. Conforme Sozo, o problema de cultivar a Pinot Noir é que a uva é complexa, muito instável e necessita de condições climáticas muito favoráveis para a elaboração do vinho. “Trabalhar com Pinot é lidar com descobertas, porque cada ano é um ano. Nesse, por exemplo, precisei colher antes e vou utilizá-la apenas para a base-espumante”, diz.
Estudos da Embrapa Uva e Vinho também apontaram como promissoras na região as variedades: Sauvignon Blanc, Merlot, Malbec e Petit Verdot.

Campos de Cima da Serra

É uma região do Rio Grande do Sul, localizada no extremo nordeste do estado, na divisa com Santa Catarina. É composta pelos municípios de Bom Jesus, Cambará do Sul, Esmeralda, Jaquirana, Monte Alegre dos Campos, Muitos Capões, Pinhal da Serra, São Francisco de Paula, São José dos Ausentes e Vacaria. Sua área total é de  21.033 km² e está localizada numa altitude entre 900 a 1.100 metros. É justamente essa altitude, que associada a demais fatores naturais, como solos profundos e paisagens abertas, exerce efeito marcante nos vinhos. A baixa temperatura e a incidência constante do vento propiciam uma maturação mais longa e condições para que as uvas viníferas apresentem excelente sanidade.

Matéria Pinot Noir 2

Vinhos de altitude
A região dos Campos de Cima da Serra se enquadra no quesito de vinhos de altitude. São características desses vinhos:

Tintos tranquilos: predomínio de aromas vegetais, frutados e doces de frutas.
Brancos tranquilos: predomínio de aromas frutados, notas florais são menos frequentes devido ao grau de maturação avançado em que as uvas são colhidas.
Espumantes: presença de aromas florais mesclados a aromas de evolução (frutas maduras e especiarias) são características comuns a esses vinhos.

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