Suco de uva em queda, espumantes em alta

Empresários e lideranças do setor vitivinícola avaliam o desempenho comercial do primeiro semestre

 

As estatísticas de comercialização de produtos vitivinícolas no primeiro semestre de 2025, comparadas ao mesmo período de 2024, revelam sinais de alerta para o setor de sucos de uva. Enquanto os vinhos de mesa se mantiveram estáveis e os vinhos finos registraram leve retração de 2%, o espumante tipo champanha (brut, extra, nature e demi-sec) cresceu 16,9%, consolidando-se como o destaque positivo do período, ao lado da estabilidade nas vendas de moscatéis espumantes.

Os dados analisados são relativos à comercialização das empresas do Rio Grande do Sul, declarados ao Sistema de Declarações Vinícolas (Sisdevin) da Secretaria de Agricultura (Seapi). Contudo, há divergências na interpretação, já que algumas entidades não consideram devoluções do varejo ou transações a granel entre empresas. Nesta análise, a avaliação está sendo realizada a partir dos dados elaborados pela Central das Cooperativas Vinícolas (Cenecoop).

Vale ser destacado que o único ponto de divergência está nos dados informados pelo presidente da Uvibra, Daniel Panizzi, diretor da Vinícola Don Giovanni, que apresenta um crescimento de 10% na venda de vinhos finos neste primeiro semestre, um total de 10,3 milhões de litros. Para ele, “um bom resultado”.  Nos demais produtos, os volumes de vendas são bastante semelhantes. Panizzi também reforça que “as safras, de 2020 para cá, foram excepcionais, então acho que a gente começa a perceber um aumento considerável de qualidade nos produtos”.

Sem considerar as divergências de informações, observa-se que o mercado de vinhos apresentou, até junho, desempenho semelhante ao do ano passado. Mas o que preocupa o setor, são as perspectivas para o segundo semestre. Neste período do ano passado, as vendas não tiveram o desempenho esperado. Isto pode ter influenciado positivamente o primeiro semestre de 2025. Os dados estatísticos analisados são da saída dos produtos da indústria para o varejo, o qual não se conhece o desempenho, podendo este canal estar abastecido ou não. Por outro lado, o inverno rigoroso nas regiões Sul e Sudeste pode estar impactando positivamente no consumo de vinhos.

“Desempenho não foi ruim’

O presidente do Conselho de Administração da Vinícola Perini, Franco Perini, ao avaliar os dados do setor, afirma que considerando o cenário político e econômico, “a performance do setor neste primeiro semestre não foi ruim”. Por outro lado, ele revela que há apreensão no mercado com o agravamento da situação no segundo semestre. Para Franco, a grande batalha se dá nas categorias de baixo valor, com preços de entrada, onde está o consumidor de baixa e média renda. Por outro lado, “onde conseguimos posicionar qualidade X valor nossa performance foi satisfatória, garantindo crescimento e sensível ganho de market share” finaliza Perini.

Júlio Fante, da Fante Bebidas, aponta que os custos operacionais têm aumentado acima da média e que as empresas, em regra geral, estão desenvolvendo um esforço muito grande para manter os volumes de comercialização, concordando que o cenário apresenta inseguranças. Embora o segundo semestre tenha tido historicamente desempenho melhor do que o primeiro, neste ano o cenário institucional e político-econômico pode apresentar situações de imprevisibilidade.

Para Rodrigo Valério, diretor de Marketing e Vendas da Cooperativa Vinícola Aurora, o primeiro semestre deste ano foi marcado por um cenário desafiador para o setor de vinhos e espumantes no Brasil. “Em meio a um ambiente econômico instável, oscilações no consumo e pressão constante sobre custos e margens, o mercado precisou se reinventar para manter o ritmo. Produtores, importadores e distribuidores encararam um contexto competitivo acirrado, com mudanças no perfil do consumidor, maior exigência por qualidade e diferenciação, e a necessidade de equilibrar preços acessíveis com a valorização do produto”.

Rodrigo Valério aponta que mesmo diante dessas dificuldades, o setor demonstrou resiliência. “A força das marcas, a busca por inovação e a valorização da produção nacional foram fundamentais para atravessar esse período. Mais do que vender garrafas, foi um momento de reafirmar propósito, estreitar laços com o consumidor e preservar a cultura e a identidade do vinho e do espumante no país. Um semestre que testou limites, mas também reforçou a capacidade de adaptação e superação da cadeia vitivinícola brasileira”, avaliou Valério.

 

Comercialização no 1º Semestre

Suco de uva 2024 2025 Variação %
Concentrado (milhões de kg) 20,10 14,20 – 29,18
Integral (milhões de litros) 53,09 48,00 – 9 ,41
Reconstituído (milhões de litros) 12,37 5,81 – 53,02

 

Vinhos e Espumantes 2024 2025 Variação %
De mesa (milhões de litros) 91,29 91,39 +0,12
Finos (milhões de litros) 9,52 9,32 -2,00
Espumantes (milhões de litros) 4,34 5,08 +16,9
Moscatéis (milhões de litros) 2,56 2,57 +0,49

Fonte: Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Dados SDA/Sisdevin)

Elaboração: Leocir Bottega – Cenecoop/Fecovinho

 

Suco de Uva

A queda nas vendas de suco de uva aconteceu nas três categorias: redução de 9,14% para o suco integral, 29,18% no concentrado e 53% nos sucos reconstituídos. O suco concentrado é utilizado como matéria prima para produção de suco de uva reconstituído ou para mistura com outras frutas dando origem a bebidas mistas de uvas ou néctares de uva, estes diluídos com até 50% de água.

A explicação para esta queda, para alguns produtores, está na mudança de formulação de algumas bebidas e, no aumento de preço que o suco integral foi submetido no ano passado. As novas formulações presentes no mercado, neste primeiro semestre, demonstram que cresceu a oferta de bebidas mistas elaboradas com suco de uvas, diminuindo o consumo do suco integral ou 100% uva. Esta mudança pode estar refletindo o que aconteceu no ano passado, quando a falta de produto ocasionada pela redução da safra, fez com que as uvas fossem pagas em valores acima do mínimo, elevando assim de maneira geral o preço dos produtos.

A safra de uvas no Rio Grande do Sul em 2024 teve uma queda de 26,58% em relação a 2023, com a produção totalizando 485 milhões de quilos. Essa diminuição foi observada tanto nas uvas viníferas quanto nas americanas e híbridas. Por sua vez, embora o preço mínimo da uva estivesse sido estabelecido em R$ 1,50, a grande maioria pagou mais de R$ 2,00 por kg de uva em 2024.

Com preço mais alto na matéria prima, os envasadores de sucos buscaram substituir o suco integral e, principalmente o reconstituído, por outros produtos, dando vasão a produtos denominados bebidas mistas, elaborados com suco de uva adicionado a suco de maçã e outras frutas.

Esta mudança na formulação se dá em busca de redução do preço, buscando adaptar a comercialização à capacidade de compra do consumidor, por um lado, e por outro, a romper com o aumento de preço deste produto, consequência do aumento do preço das uvas na safra de 2024.

Outra causa apontada pelos produtores para a redução do consumo no suco de uva é a queda do poder aquisitivo. Os dados econômicos mostram que, de 2024 para 2025, embora o poder de compra do salário mínimo aumentou de 1,77 para 1,79 cestas básicas neste ano, uma pequena variação, para quem tem renda média houve diminuição do poder de compra, passando de 4,06 para 3,87 cestas básicas, ou seja, na base o poder de compra aumentou, mas na média, caiu, atingindo fortemente os consumidores de suco de uva.

Outro fator que pode ter impactado em redução nas vendas do suco de uva foi o fato de que muitas empresas que vendiam suco integral retiraram produtos no mercado no ano passado, seja por não ter produto para vender ou pela queda de rentabilidade na categoria. Este espaço foi substituído por outros produtos. E, quando se deixa de abastecer o mercado, é difícil e custoso retornar e reconquistar o mesmo espaço.

Este cenário aponta de forma a impactar negativamente a próxima safra, pois a produção de suco de uva foi grande, consumindo mais de 50% da quantidade de uvas de mesa e, por outro lado, com a quede de consumo, pode acarretar estoques de passagem acima do normal.

Panizzi alerta para impactos de longo prazo: “o consumidor já se encontra conectado com outro tipo de suco. A gente precisa ter um olhar mais atento ao suco de uva porque ele é um produto muito representativo na cadeia. A gente está falando de 50% da produção de uvas do Rio Grande do Sul que são destinadas a esse tipo de produto”. Ele adiantou que o Consevitis-RS prepara nova campanha para reforçar os benefícios do suco de uva.

Leocir Bottega, diretor executivo da Cenecoop, destaca que o suco integral é um produto de giro rápido, comercializado no mesmo ano da safra. Para ele, a saída de empresas do segmento abriu espaço para concorrentes de outras categorias. “Perdemos rapidamente uma fatia importante do mercado, conquistada com muito trabalho em muitos anos. É necessária uma ação muito rápida e assertiva para recuperar esses consumidores”, reforça.

Espumantes em alta

Enquanto o mercado para os vinhos verde-amarelos se mantém e os sucos estão em queda, o que alegra os produtores do Sul são os vinhos espumantes. Considerados a ‘joia da coroa’, eles têm apresentado crescimento constante nos últimos anos. Para Júlio Fante, este crescimento uniforme, “é reflexo da ótima relação qualidade e preço que temos neste segmento”. Daniel Panizzi afirma que isto se deve “por uma inserção desse tipo de produto em situações mais ocasionais e não só comemorativas, como o espumante foi sempre visto”. Ele também destaca que o espumante brasileiro “é um produto com custo-benefício muito bom, quando comparado a produtos importados”.

Já Leocir Bottega, da Cenecoop, avalia como relativo o crescimento de quase 17% dos espumantes, pois, historicamente, “mais de 70% dos volumes de comercialização anual de espumantes se dá no segundo semestre e estes representam menos de 5% das uvas produzidas no estado”.

 

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