
Por Evelin Queiroz
Pela primeira vez, participei da Avaliação Nacional de Vinhos, conhecida como a maior degustação de vinhos do mundo. O evento faz jus à fama. Um auditório repleto — cerca de 800 pessoas — reunidas para descobrir, ao mesmo tempo, o que poderá chegar às taças do Brasil e do mundo. Ali, entre risos, taças e expectativas, celebrava-se algo que vai muito além da bebida: a identidade de um país que aprende a se reconhecer também pelo vinho.
Mas, para ser sincera, eu não venho de um lugar onde há tradição de vinho. Talvez os gaúchos, mineiros e paulistas presentes no evento — e até os convidados internacionais — vivam imersos nessa cultura herdada. Viram pais, avós e bisavós beberem ao redor da mesa, em almoços longos e conversas de domingo.
No Nordeste, e especialmente em Recife, de onde venho, essa cultura não existia. O vinho parecia um universo distante, reservado a outros sotaques e temperaturas.
Foi só quando me mudei para Petrolina, no coração do Vale do São Francisco, que me aproximei de verdade do vinho. Na época da faculdade, comecei com as primeiras degustações — encontros simples e despretensiosos entre amigos, sob o céu estrelado do sertão.
E, claro, começando pelos vinhos suaves. Não é assim que muitos começam quando o vinho ainda é uma novidade? Por isso, um brinde aos vinhos de mesa: eles foram o meu primeiro convite para esse universo. Depois deles, nunca mais parei.
De Petrolina, o destino me levou a São Luís do Maranhão, e lá o vinho ganhou outro papel. As adegas dos supermercados se tornaram pontos de encontro. Eu e minhas amigas de trabalho nos reuníamos às sextas-feiras para almoçar, conversar e experimentar novos rótulos. O sommelier já nos conhecia, deixava algo gelando, e sob o calor absurdo do meio-dia maranhense, trocávamos taças e risadas.
Não era apenas sobre vinho — era sobre amizade, pausa e alegria compartilhada. O vinho apenas selava o ritual.
Alguns anos depois, a vida me trouxe a Caxias do Sul, no coração da Serra Gaúcha. Recebi então o convite para escrever sobre o setor vitivinícola. Meu chefe, em tom desconfiado, perguntou:
— “Você gosta de vinho?”
Eu estava prestes a apreciar um Riesling, e respondi com sinceridade:
— “Gosto, sim!”
Sem saber que aquela resposta marcaria o início de uma nova etapa.
Foi aqui que comecei a me aprofundar: a estudar, degustar, comparar safras e uvas. A família, claro, virou minha fiel cobaia. A primeira amizade em Caxias foi com um vendedor de vinhos — o que, convenhamos, é uma sorte para os dois lados. Hoje, ainda sento com a atual proprietária da loja, que virou amiga, para apreciarmos juntas.
Aprendi, com o tempo, que o vinho é memória líquida. Ele carrega lugares, histórias e afetos. O professor Jesús de Las Heras Roger, da Cátedra de Agroturismo e Enoturismo das Ilhas Canárias, me disse algo esta semana que resume bem isso: “O vinho bebido em companhia é moderado. É o vinho que faz bem, porque as pessoas conversam, relaxam, comem, bebem e não têm pressa.”
E é verdade. O vinho me fascina pelo que ele representa — a vida ao redor da mesa. Onde há riso, há brindes. Onde há vinho, há presença.
Na Avaliação Nacional de Vinhos, essa sensação se multiplicou. Era como se centenas de pessoas, desconhecidas entre si, se tornassem velhos amigos por alguns instantes. O vinho, ali, cumpria seu papel: aproximar.
Se você ainda não participou da Avaliação, vá.
Se já foi, espero que o tempo não retire de você o encantamento simbólico dessa grande festa — porque ela não é apenas sobre vinho, mas sobre as pessoas que brindam com ele.
Até a 34ª Avaliação! 🍷
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Uma resposta
Tenho muito a aprender sobre o vinho, e a cada degustação um prazer compartilhado com a família e amigos. É isso Evelin, o vinho aproxima.