
Ontem, 13 de outubro de 2025, o mundo do vinho perdeu uma de suas vozes mais elegantes, generosas e inesquecíveis. Carlos Ernesto Cabral de Mello — o enófilo, educador, pesquisador e comunicador que moldou a cultura do vinho no Brasil — partiu aos 75 anos, deixando um legado que ultrapassa garrafas, taças e rótulos.
Nascido em 11 de abril de 1950, em São Paulo, Cabral foi mais do que um estudioso: foi um tradutor do vinho para o coração e a linguagem do brasileiro. Em uma época em que o vinho parecia reservado a poucos, ele abriu as portas da adega, ensinando que o prazer de uma boa taça é também uma forma de cultura, convivência e respeito.
Educador de gerações
No Grupo Pão de Açúcar, onde trabalhou por décadas, Cabral revolucionou a relação entre consumidor e garrafa. Percebeu que o brasileiro não comprava vinho por medo de errar — e, com sensibilidade e método, criou os atendentes especializados que ficaram conhecidos como os “Cabraizinhos”. Foram centenas de jovens formados por ele, espalhados pelo país, ajudando pessoas comuns a descobrir seu primeiro vinho com prazer e confiança.
Fundador da Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho (SBAV), Cabral foi pioneiro na formação de confrarias e na construção de uma cultura enológica acessível. O movimento iniciado por ele nos anos 1980 semeou a curiosidade e o gosto pelo vinho em cidades de todo o Brasil — e pode-se dizer, sem exagero, como bem afirmou o jornalista Rogerio Ruschel, que a história do vinho brasileiro tem um antes e um depois de Carlos Cabral.
Homem dos livros e das histórias
Entre suas obras, o livro “Presença do Vinho no Brasil – Um Pouco de História” é leitura obrigatória para quem deseja compreender a trajetória da bebida em nosso país. Seu “Dicionário Ilustrado do Vinho do Porto”, escrito com Manuel Pintão, é considerado referência mundial sobre o tema. Já em “A Mesa e a Diplomacia Brasileira: o pão e o vinho da concórdia”, Cabral mostrou como o vinho também faz parte da construção do prestígio e da identidade do Brasil no cenário internacional.

Autor prolífico, detalhista e apaixonado, Cabral escrevia com o mesmo tom com que falava — firme, mas generoso; técnico, mas cheio de afeto pela história, pelas pessoas e pelas alegrias que o vinho proporciona.
Mesmo depois de aposentado, continuou ensinando — agora pelas redes sociais. No Instagram @cabralvinhos, seus vídeos seguem disponíveis, eternizando o sorriso calmo, o olhar sábio e o tom acolhedor com que falava sobre harmonizações, tipos de uva e boas maneiras à mesa. O vídeo publicado em 4 de outubro, pouco antes de sua partida, é o retrato fiel de quem nunca parou de compartilhar o que sabia.
Sua última entrevista, ao SommCast – Podcast do Vinho, disponível no YouTube, foi um brinde à vida — duas horas de conversa com um homem que tinha o dom raro de tornar o conhecimento leve e o vinho humano.
Um brinde à eternidade
Carlos Cabral foi membro das confrarias do Vinho do Porto, do Alentejo e do Pequiquita, e recebeu o título máximo de Infanção da Confraria do Vinho do Porto. Mas talvez o maior título que carregue seja o de mestre do vinho — aquele que formou consumidores, profissionais e amigos.
Todo aquele que hoje ergue uma taça no Brasil — seja em um jantar, em uma aula ou em uma celebração — deve, de algum modo, um agradecimento silencioso ao homem que nos ensinou a brindar com inteligência, simplicidade e alma.
Seu legado continuará fermentando conhecimento, cultura e amizade em cada gole de vinho brasileiro.
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Uma resposta
Parabéns, Cabral é um marco no desenvolvimento e na paixão pelo vinho no Brasil.