
O enoturismo é muito mais do que uma taça de vinho: é uma experiência cultural que envolve história, memória e identidade. Com essa mensagem, Emanuela Panke, presidente da Iter Vitis Les Chemins de la Vigne, abriu o 1º Encontro Brasileiro de Enoturismo, promovido pelo Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) – Campus Bento Gonçalves.
A palestra de abertura, intitulada “Enoturismo como expressão cultural: raízes europeias e identidade brasileira”, apresentou uma reflexão profunda sobre o papel do turismo do vinho na valorização do patrimônio imaterial e no fortalecimento da identidade de povos e territórios.
Reconhecida como um Itinerário Cultural certificado pelo Conselho da Europa, a Iter Vitis reúne países comprometidos com a preservação, valorização e promoção do patrimônio vitivinícola como parte essencial da herança cultural. O princípio da iniciativa é que “o enoturismo vai muito além de provar vinhos. Ele representa uma experiência cultural completa que envolve história, memória e identidade”.
Para Emanuela Panke, a verdadeira fascinação está na vitivinicultura em si — na paisagem, nos saberes tradicionais e na narrativa histórica que acompanha cada vinha. Ela alerta para uma tendência contemporânea que pode afastar o setor de sua essência. “Muitos promotores do enoturismo buscam cegamente o efeito wow. Mas o espetáculo já está no vinho e em tudo o que ele representa”, lembra.
Emanuela apresentou exemplos de países que integram a rede Iter Vitis, que se estende da Geórgia a Portugal, passando por Luxemburgo, Tunísia e Líbano — regiões que integram turismo, patrimônio e educação em torno da cultura do vinho.
Na Europa, o enoturismo é orientado por valores e missão cultural bem definidos, que incluem:
- Proteção do patrimônio material e imaterial ligado à viticultura;
- Diálogo intercultural e valorização das especificidades locais;
- Fortalecimento da identidade europeia comum;
- Apoio às economias locais em comunidades rurais e pós-conflito.
Esses princípios, segundo Emanuela, poderiam inspirar o Brasil, um país “de vasto território e múltiplas culturas”, a desenvolver uma estratégia de enoturismo ancorada em autenticidade e sustentabilidade.
Em sua apresentação, Emanuela defendeu que reviver tradições esquecidas é a chave para o futuro do enoturismo. Rituais, festivais, costumes e práticas transmitidas entre gerações formam o elo que une o visitante ao território. “O enoturismo deve ser uma ferramenta de preservação cultural, um meio de reconectar comunidades às suas raízes e de transmitir o valor do vinho às novas gerações”, reforçou.
Ela destacou iniciativas europeias, como a inserção do ensino sobre uvas e vinificação em escolas da Grécia, e livros didáticos publicados em outros países para educar crianças e adolescentes sobre a história e a cultura do vinho.
A proposta é que o Brasil também valorize a educação patrimonial e o storytelling como parte das estratégias de marketing e sustentabilidade do setor.
Brasil como território de identidades múltiplas
Durante a palestra, Emanuela enfatizou que o Brasil ocupa um lugar singular no mapa mundial da vitivinicultura. “O país reúne, em um mesmo território, as tradições de várias culturas europeias — italiana, alemã, portuguesa e espanhola — reinterpretadas de forma criativa e acolhedora”, pontuou.
Enquanto países como a África do Sul destacam a história, a Austrália investe em inovação e a Califórnia no luxo, o Brasil se diferencia pela pluralidade cultural e pela experiência sensorial e humana que oferece.
A presidente da Iter Vitis revelou que o Conselho da Europa lançou um programa para conectar os Itinerários Culturais à América do Sul, com o objetivo de criar pontes entre regiões europeias e latino-americanas por meio do patrimônio e do diálogo intercultural.
O Brasil, segundo Emanuela, tem potencial para se tornar protagonista nesse movimento, fortalecendo sua presença em itinerários transnacionais que conectam famílias, tradições e uvas entre os dois continentes.
Ela defende que o turismo identitário e a integração entre gastronomia, arquitetura, música e tradições podem transformar o enoturismo brasileiro em uma poderosa ferramenta de desenvolvimento sustentável, educativo e cultural.
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