Impressões sobre um dos expoentes do ‘Novo Mundo do Vinho’

Engenheiro agrônomo Antonio Santin relata o que viu, no começo de maio, na África do Sul

A região vitivinícola de Stellenbosch.
A região vitivinícola de Stellenbosch.

O agrônomo Antonio Santin, consultor técnico em viticultura, com clientes em todo o Rio Grande do Sul, e também conselheiro editorial do jornal A Vindima, visitou recentemente um dos expoentes do ‘Novo Mundo do Vinho’, a África do Sul. Ele esteve lá de 1º a 8 de maio, conhecendo vinhedos e vinícolas nas duas principais regiões produtoras locais, Constantia e Stellenbosch. A ‘missão técnica’ foi composta por 17 pessoas, a maioria produtores de uva da Campanha Gaúcha. No artigo a seguir, Santin apresenta um relato da vitivinicultura no país africano – num momento em que ele ‘está na vitrine’, afinal, considerando o início da Copa do Mundo no dia 11 de junho próximo:

 

A vitivinicultura da África do Sul impressiona, inicialmente, pela estrutura das vinícolas, tanto sob o aspecto tecnológico quanto pela beleza das mesmas, pois o apelo turístico está muito presente em todas. Percebe-se a preocupação com produzir com qualidade em todas as fases do processo, quer seja no vinhedo como dentro da vinícola.

 

Quando se fala em vinhedo, é verdade que são privilegiados pelas condições climáticas que têm: nas regiões visitadas, Constantia e Stellenbosch, a precipitação média anual é de 1,4 mil milímetros (na Serra Gaúcha, em Bento Gonçalves, conforme a Estação Agroclimática da Embrapa Uva e Vinho, é de 1.736 milímetros), mas, deste total, 70% ocorre nos meses de junho ao final de agosto (ou seja no período de dormência da videira). Normalmente, em setembro e maio chove cerca de 100 milímetros por mês. Por fim, de outubro ao final de março (época da colheita), a precipitação média é de 25 milímetros por mês.

Dessa forma, ainda que o clima não seja totalmente seco, há necessidade de irrigação durante a fase de desenvolvimento da videira, e essa é totalmente monitorada, para evitar o excesso de água e, assim, controlar o vigor das plantas. Para determinar quando irrigar e quanta água colocar, utilizam sensores que medem a condutividade do solo (a capacidade de retenção de água) na altura das raízes grossas, médias e finas. Esses condutores enviam para uma central dados de cinco em cinco minutos, de posse dos quais estabelecem o momento exato e a quantidade de água que devem colocar. A irrigação é feita somente durante a fase de desenvolvimento; no momento em que inicia a maturação da uva, suspendem-na totalmente – e, coincidentemente, no período de vindima, janeiro e fevereiro principalmente, praticamente não chove. Com essas medidas, conseguem reter o vigor das plantas e, ao mesmo tempo, reduzir o diâmetro normal das bagas e, assim, produzir uva de melhor qualidade.

 

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‘Fazendo do limão uma limonada’
Embora tenham pouca chuva durante o ciclo vegetativo da videira, elas não estão totalmente imunes às doenças. Dentre as mais comuns na região estão míldio, oídio e Botrytis cinerea. Para o controle, usam fungicidas normais, com a média de 15 aplicações por ano; para Botrytis (Podridão cinzenta), há quem use Trichoderma. Um dos grandes problemas sanitários que enfrentam – e parece que os preocupa muito – é a virose do enrolamento das folhas (Leaf roll), que afeta principalmente a variedade Pinotage.

 

Se a presença de Botrytis pode causar arrepios entre nossos viticultores, eles conseguem ‘fazer do limão uma limonada’. Por ser o clima mais seco, mas assim mesmo com chuvas ocasionais, conseguem que se desenvolva a ‘Podridão nobre’ e, dessa maneira, elaboram um vinho licoroso muito saboroso e, ao mesmo tempo, muito caro.

 

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Tecnologia na viticultura e inovação em enologia
Além de usarem tecnologia de ponta na determinação da necessidade de irrigação, há empresas que usam fotografia aérea com raios ultravioletas e infravermelhos para estudar as condições das plantas dentro de cada bloco. Através destas imagens, compilando os dados, conseguem mapear os tipos de solos existentes, o vigor das plantas e a sanidade das mesmas. Isso os ajuda na colheita, quando, usando as análises fenológica e sensorial das bagas, definem o momento certo e colhem cada mancha separada e vinificam individualmente.

 

É natural, como acontece em todas as regiões vitivinícolas, existirem diferentes solos e microclimas, e eles têm isto muito bem-estabelecido. Conforme o tipo de solo e o clima na área, escolhem a variedade que melhor se adapta a essas condições, por meio do que conseguem vinhos distintos, até dentro da mesma propriedade. Isto pudemos constatar através de degustações.

 

No que se refere mais especificamente ao solo, há diferentes tipos, variando do arenoso ao argiloso e xistoso, de profundos a rasos e de férteis a baixa fertilidade. Segundo cada tipo de solo utilizam um porta-enxerto diferente. Entre os mais adotados estão o R 110, o R 99 e o 101-14.

 

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Quanto à adubação, normalmente fazem a correção do solo e, após, trabalham com adubação verde anualmente nas entrefilas, usando gramíneas e leguminosas. De dois em dois anos fazem uma suplementação com composto orgânico. Ele é obtido pela compostagem de: ramos da poda (picados), bagaço da uva (casca e sementes), folhas de árvores que caem e são juntadas nos pátios e sede das vinícolas e grama que recolhem no momento do corte.
Em relação à vinificação, verificamos que a maioria utiliza o resfriamento da uva antes do desengace. Normalmente, deixam 12 horas em câmara frigorífica e, após, desengaçam-na. A maioria das vinícolas usa tanques de fermentação suspensos (presos no teto, sendo que a boca localiza-se a dois metros do solo): segundo eles, isso facilita a operação de retirada do bagaço e das borras e aumenta o espaço interno da vinícola.

 

Mas nem só de trabalho se constituiu a missão. No momento de lazer que tivemos, aproveitamos para visitar o Cabo da Boa Esperança, ponto geográfico importante para que nosso continente fosse descoberto pelos espanhóis e portugueses”*.

 

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Por * Antonio Santin
Foto: Antonio Santin

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